O filme “Oxigênio” desafia a atriz protagonista a transmitir, quase que exclusivamente de um espaço minúsculo, uma profunda sensação de desespero e isolamento, em uma narrativa que ecoa uma luta constante contra a morte. A trama gira em torno de uma inteligência artificial, explorando o antigo debate sobre a superioridade humana diante das máquinas, tema recorrente no cinema, mas que ganha um novo fôlego com a produção recente, sugerindo que essas histórias estão se tornando cada vez mais frequentes, e essa tendência parece estar se intensificando.
Lembrando o conceito explorado por Spike Jonze em “Ela” (2013), onde o homem se encontra subjugado pela máquina representada por uma voz feminina, “Oxigênio”, dirigido por Alexandre Aja, propõe uma abordagem diferente, ainda que com similaridades. Aja, conhecido pelo filme “Amaldiçoado” (2013), utiliza a personagem de Elizabeth Hansen, vivida pela talentosa Mélanie Laurent, para explorar a arrogância humana.
Hansen, uma geneticista que se dedica a criar uma versão aprimorada da humanidade, desperta repentinamente em uma cápsula criogênica, sem qualquer lembrança de como chegou lá, isolada e fora da Terra. Sua única companhia é um dispositivo chamado MILO (Medical Interface Liaison Operator), que se torna sua única esperança de sobrevivência à medida que o oxigênio disponível na cápsula diminui rapidamente. A performance de Mathieu Amalric como a voz de MILO confere ao dispositivo uma precisão fria, uma escolha que contrasta com a representação mais humana que Scarlett Johansson deu ao sistema operacional em “Ela”.
Um dos temas centrais de “Oxigênio” é a clássica narrativa da máquina que se volta contra o homem, um conceito imortalizado por “2001: Uma Odisseia no Espaço” (1968) de Stanley Kubrick. Assim como o HAL 9000 de Kubrick, o MILO de “Oxigênio” executa suas funções de forma impecável, até o momento em que algo dá errado, levando Hansen a uma situação desesperadora, semelhante à da tripulação liderada por Bowman em “2001”. A frieza e o cinismo de MILO, que em um determinado ponto informa Hansen que suas chances de sobrevivência são de 0%, refletem a mesma inquietante perfeição que HAL, sugerindo que ambas as inteligências artificiais carregam traços da complexidade moral humana, um legado de seus criadores.
A narrativa de ”Oxigênio” também evoca comparações com o filme “Ex_Machina: Instinto Artificial” (2015) de Alex Garland, onde a humanidade é confrontada por uma criação sua, ainda que, em “Oxigênio”, a situação seja distinta. Hansen já não é exatamente humana e encontra-se em um planeta diferente, não na Terra. Aja, com sua visão menos niilista em comparação a Kubrick e Garland, abre espaço para discussões sobre a possibilidade e, talvez, a necessidade de um modelo humano aprimorado.
Embora Aja não reinvente a estética clássica da ficção científica espacial, ele consegue criar uma sensação de familiaridade ao usar elementos consagrados por Kubrick, mas não sem antes inserir suas próprias reviravoltas, ainda que sutis, em função do espaço limitado em que a narrativa se desenrola. O talento de Laurent é essencial para manter o público envolvido em uma história que, apesar de sua ambientação claustrofóbica, oferece momentos de tensão genuína.
“Oxigênio”, na Netflix, conduz a audiência por um drama que, embora aparentemente simples, oferece uma reflexão profunda sobre a natureza humana e nossa crescente dependência da tecnologia. À medida que o homem se torna mais dependente de máquinas que não compreende completamente, ele se distancia de sua própria humanidade, tornando-se mais vulnerável e infeliz. Essa premissa, embora explorada de diferentes formas ao longo das últimas décadas, continua a ressoar fortemente na cultura cinematográfica, oferecendo novos olhares sobre questões que permanecem urgentes e relevantes.
Filme: Oxigênio
Direção: Alexandre Aja
Ano: 2021
Gêneros: Ficção científica/Drama/Suspense
Nota: 9/10