Lindo, profundo e de cortar o coração: filme no Prime Video vai te envolver, te deixar sem fôlego e fascinado do começo ao fim Divulgação / A24

Lindo, profundo e de cortar o coração: filme no Prime Video vai te envolver, te deixar sem fôlego e fascinado do começo ao fim

Todos enfrentamos as adversidades da vida. No filme “As Ondas” (2019), o diretor Trey Edward Shults ilustra que viver não se resume a simplesmente seguir a correnteza, mas sim a observar o movimento do oceano para antecipar possíveis tempestades. E essas tempestades, inevitavelmente, acabam surgindo. Shults já havia demonstrado seu talento em outros dois filmes notáveis e tem se especializado em examinar as profundezas da psique humana, uma rede tão complexa que um pequeno desequilíbrio pode desencadear consequências devastadoras.

 Assim como em “Krisha” (2015) e “Ao Cair da Noite” (2017), “As Ondas” oferece um estudo detalhado das relações humanas, que estão sempre suscetíveis a desajustes, uma vez que cada indivíduo é um universo à parte. Os três trabalhos de Shults se destacam como grandiosos e profundos, refletindo o crescimento do diretor na exploração das questões fundamentais da existência. Em 2019, Shults entrega um drama familiar mais profundo do que muitos lançados anualmente, oferecendo uma narrativa de redenção para um personagem que, após enfrentar seu próprio inferno pessoal, encontra suporte e transformação através de outra pessoa.

A abertura de “As Ondas” é tranquila. A câmera se movimenta em torno de Tyler, interpretado por Kelvin Harrison Jr., enquanto ele dirige por uma estrada da Flórida. Ao seu lado está Alexis, vivida por Alexa Demie, com quem troca carinhos e canta músicas, mantendo a atenção na estrada. A fotografia de Drew Daniels destaca a silhueta de uma menina andando de bicicleta sob o sol da tarde, uma imagem simples, mas marcante, que apresenta Emily, a irmã de Tyler, interpretada por Taylor Russell. Completam o núcleo principal Catherine, a madrasta solidária interpretada por Renée Elise Goldsberry, e Ronald, o pai severo e exigente, vivido por Sterling K. Brown, que reforça que meninos negros não têm margem para erro — especialmente aqueles, como Tyler, que estão buscando alcançar grandes feitos. Esses personagens e suas dinâmicas começam a delinear os conflitos centrais de “As Ondas”.

O filme se destaca pela inovação narrativa. Diretores como Trey Edward Shults, que se junta a outros como Jordan Peele e Anthony Mandler, tem liderado uma importante iniciativa ao retratar famílias afro-americanas de uma forma que desafia os estereótipos predominantes. Nessas produções, vemos famílias de classe média alta, com acesso à educação e refinamento, em contraste com as representações convencionais. Tyler, o protagonista, é um exemplo perfeito: um estudante exemplar em uma escola de elite, envolvido em wrestling, com um relacionamento saudável e habilidades em piano. Entretanto, a pressão para atingir essas metas cria um ambiente de tensão, especialmente com o pai exigente que quer que o filho compreenda a dureza da vida desde cedo.

Tyler enfrenta um problema sério com uma lesão no ombro, que se não for tratada rapidamente, pode afetar permanentemente sua mobilidade. Ele rejeita o conselho médico devido ao impacto que isso teria em sua temporada de competições, suas notas e seus planos futuros. À medida que seus sonhos começam a desmoronar, ele começa a se automedicar com analgésicos potentes e desenvolve um vício. A situação piora com problemas relacionados a Alexis, levando a uma reviravolta crucial na trama e fazendo com que a história passe a ser vista através da perspectiva de Emily.

O roteiro de “As Ondas”, com seu começo ensolarado que rapidamente se transforma em uma tempestade, só se sustenta graças a uma atuação robusta e convincente. Kelvin Harrison Jr. prova seu talento ao transitar entre euforia e profunda melancolia com impressionante habilidade. No entanto, o grande destaque do filme é Taylor Russell, cuja performance emocional e intuitiva oferece um contraste poderoso com o aspecto mais cerebral do trabalho de Shults. Russell, inicialmente apagada, se transforma em um furacão dramático que captura a atenção do público. Sterling K. Brown, como Ronald, interpreta com sutileza, revelando a complexidade de um pai que projeta suas frustrações no filho, mantendo a autenticidade do personagem.

“As Ondas” possui uma grandeza própria, semelhante a filmes como “Moonlight: Sob a Luz do Luar” (2016), de Barry Jenkins, em sua capacidade de equilibrar lirismo com uma natureza mais crua e violenta. Trey Edward Shults constrói sua carreira com um foco consistente na qualidade tanto do conteúdo quanto da forma, e a montagem do filme, junto com sua fotografia, demonstra um alto nível de sofisticação técnica. A combinação da técnica com a profundidade artística distingue “As Ondas” como uma obra-prima.

Apesar dos erros que Tyler comete, movidos por vaidade e excessos, o filme oferece uma visão mais conciliatória da vida, apresentando uma segunda chance, embora deixando claro que o futuro será muito diferente. As ondas da existência sempre trazem dor, mas também a oportunidade de transcendência. Basta estarmos preparados para isso.


Filme: As Ondas
Direção: Trey Edwards Shults
Ano: 2019
Gêneros: Drama/Romance/Coming-of-Age
Nota: 9/10