Primeiro filme da franquia, que faturou 1 bilhão de dólares nas bilheterias, acaba de estrear na Netflix Divulgação / Twentieth Century Fox

Primeiro filme da franquia, que faturou 1 bilhão de dólares nas bilheterias, acaba de estrear na Netflix

Prestando bons serviços à humanidade desde 1849, a Kingsman tem um passado nebuloso — logo, não se importa em recorrer aos métodos mais questionavelmente heterodoxos para levar a termo seus propósitos. Em sendo assim, jamais poderia haver problema em se recorrer a um possível novo herói saído sabe Deus de onde, sobre o qual paira todo gênero de incertezas, sensação que sua origem marginal corrobora.

Matthew Vaughn não ousa remover todo o verniz glamoroso da franquia numa só tacada, mas em “Kingsman: The Secret Service” procura dar ênfase maior ao universo de gângsteres poderosos que atormentam a civilização, aproximando-os dos gloriosos 165 anos de história da equipe de inteligência mais tresloucada do planeta, uma espécie de MI6 ou FBI com senso de humor aflorado. A adaptação da história em quadrinhos homônima, de Vaughn, Mark Millar e Dave Gibbons publicada em 2012 preza por manter esse caráter delirante, voltado a um nonsense que faz todo o sentido. Um dos segredos da coesão da série é, sem dúvida, a afinidade entre o vasto elenco, escolhido de forma a iluminar uma determinada face da história por vez. 

Em 1997, durante um dos tantos conflitos no Oriente Médio, a comunidade internacional pensa que dessa vez o apocalipse é questão de tempo. A Kingsman entra em campo, mas chega à conclusão de que precisa de um reforço extra em seus quadros, cujas identidades se misturam às dos cavaleiros do mítico rei Artur, o guerreiro britânico que teria coordenado a defesa da hoje Grã-Bretanha contra os invasores saxões na virada do século 5º para o 6º, segundo os romances medievais. As movimentações na discreta alfaiataria de Savile Row, no centro de Londres, que funciona como sede da instituição giram em torno de Harry “Galahad” Hart e Gary “Eggsy” Unwin. 

Aqui, Colin Firth divide os holofotes com Taron Egerton, muito à vontade na pele de um punk naturalmente inconvencional em suas desavenças com a família, a mãe e o namorado abusivo dela, e juntos os dois vão puxando o roteiro, do diretor, Jane Goldman e Mark Millar, para a figura de Valentine, um multimilionário cheio de afetações que há algum tempo sonha com um projeto de poder que imagina possível pela invasão dos dispositivos eletrônicos de boa parte dos oito bilhões de habitantes da Terra. Samuel L. Jackson encarna Valentine com direito a pequenas mudanças no tom de voz que evidenciam a loucura megalômana do personagem, inicialmente sob controle, mas que degringola no sequestro de Iggy Azalea (!).

Vaughn é hábil em contrabalançar a verve agressiva de “Kingsman: The Secret Service”, o mais sangrento dos três filmes, à inescapável natureza satírica do longa, mais nítida quando Firth se esmera para ficar parecido com Harry Palmer, o espião que rivaliza com 007 interpretado por Michael Caine, que atende, claro, pelo mesmo nome que a lenda maior de Albion. Lapsos narrativos entre a introdução e o desfecho tiram muito da potência do que se quis contar, mas ninguém fica indiferente ao fato de todos, do imberbe Egerton ao veteraníssimo Caine, deitam e rolam com seus papéis. E nos divertimos com eles.


Filme: Kingsman: The Secret Service
Direção: Matthew Vaughn
Ano: 2014
Gêneros: Comédia/Ação 
Nota: 8/10