Equilibrar corpo e mente, eis o segredo da felicidade. Como uma ínfima parcela dos oito bilhões de seres humanos sobre a Terra alcança a proeza, essa bênção continua restrita a uns pouquíssimos sortudos, que talvez não devam apenas ao inesperado tal maravilha. Um devoto do tai chi, a antiga arte marcial chinesa, trabalha com um mestre idoso num belo templo, até que sua vida passa por um turbilhão, justamente por causa desse seu raro talento.
A partir dessa exposição inicial, Keanu Reeves manifesta a exótica visão de mundo que o fez celebre diante das câmeras, agora em sua estreia como diretor, em “O Homem do Tai Chi”, algo como uma inusitada mistura de filme de arte e arrasa-quarteirão dos mais pedestres, em que vale-se de intrépidos enquadramentos e diálogos quase filosóficos com o propósito de discorrer sobre assuntos como livre-arbítrio, o peso da tradição, o caráter imperativo do amor, a certeza da finitude. O roteirista Michael G. Cooney fixa-se na rotina desse homem simples, revelando aos poucos os motivos que o levam a transformar-se numa máquina letífera, natureza de que só consegue se livrar graças às magníficas artimanhas do acaso.
Tiger Hu Chen dá vida a seu personagem, Tiger Chen, emprestando-lhe muito mais que apenas o nome. Chen, um dublê que o diretor conhecera durante as gravações de “Matrix”, sempre causa surpresa ao descobrir o caminho exato por onde deve avançar, levando junto Tiger, no princípio um entregador que se resigna em conhecer toda a cidade de dentro do carro desde que possa flertar com uma charmosarecepcionista de quando em quando. Yang, o vetusto professor interpretado por Yu Hai, o aconselha a não ter pretensões de fortuna, glória ou autorrealização com o tai chi, então ele faz a coisa certa. Como o destino é traiçoeiro, uma apresentação aberta ao público o leva a esbarrar com Donaka Mark, o soturno milionário vivido por Reeves, numa das pouquíssimas ocasiões em que deixa sua cobertura revestida de couro e mármore pretos.
“O Homem do Tai Chi” envereda por um suspense bem elaborado no momento em que Tiger Chen aceita um emprego como segurança de Mark. Reeves desenvolve essa subtrama, decerto a grande reviravolta de seu filme, contando com a inusitada parceria de Hu Chen e Troy Sandford, cada qual no seu lado do tatame. O diretor aproxima-se do desfecho situando os dois no templo de Ling Kong e seus seiscentos anos de uma história feita de precisão e agilidade, mas que não aos avanços da especulação imobiliária, que planejam construir um vilarejo cultural naquele lugar de confrontos sagrados em nome da honra. Destoando dos ensinamentos do mestre Yang, Tiger Chen se decide a abrir uma escola de tai chi e prestar mais atenção a quem se diz um admirador de sua técnica. Continua seu processo evolutivo, mas não descuida do que acontece enquanto faz seus planos.
Filme: O Homem do Tai Chi
Direção: Keanu Reeves
Ano: 2013
Gêneros: Ação/Drama
Nota: 8/10