Vale a pena ficar em casa para ver: a melhor comédia de espionagem e ação de Julianne Moore está na Netflix Divulgação / Twentieth Century Fox

Vale a pena ficar em casa para ver: a melhor comédia de espionagem e ação de Julianne Moore está na Netflix

O submundo do crime exige uma medida maior de audácia, muito mais do que nas atividades protegidas por leis e estatutos. Ou seja, se destacar é difícil, e se manter vivo — metafórica e literalmente — é apenas para aqueles com sangue de predador correndo nas veias. Mais do que em qualquer outro campo, aquele que aspira ao sucesso em atividades ilegais precisa trazer à tona um lado obscuro, reprimido na personalidade de quem trabalha honestamente. 

Matthew Vaughn confere uma boa dose de glamour ao universo de gângsteres poderosos, sempre dispostos a abocanhar fortunas e vidas, em “Kingsman: O Círculo Dourado”, o segundo de três filmes sobre o serviço secreto mais caótico do mundo, todavia assim mesmo muito mais efetivo que o MI6 e o FBI juntos. A adaptação da história em quadrinhos homônima, de Vaughn, Mark Millar e Dave Gibbons publicada em 2012 preza por manter esse caráter nonsense, delirante, quase pueril, contando com um elenco estelar a fim de defender o argumento central, o que reza que nada jamais chega ao fim, no máximo ao fim do começo.

Ser livre é, muitas vezes, a maior das aspirações a que um homem pode se permitir. Prisioneiros da família; dos amigos; da carreira, que lhe permite ganhar o pão; dos outros; de si mesmo; do mundo; da vida; da morte; nunca sabemos com a certeza que nossas neuroses julgam necessária se estamos no caminho certo, por mais que a intuição sopre-nos a verdadeira resposta, que só nosso coração, invisível aos olhos morbidamente curiosos da crueldade alheia, intimamente conhece. A sensação de estar sempre à mercê do julgamento de quem nunca se preocupou em calçar nossos sapatos e experimentar na carne nossas dores é um dos flagelos com os quais toda criatura de baixo do sol tem de aprender a lidar, sob pena de perder-se ainda mais numa cornucópia de solidão e mágoa, por mais injustas que sejam as perseguições, as importunações, os achaques. Esses sentimentos tétricos que povoam a alma humana desde o berço e a conspurcam indelevelmente, só ratificam que ninguém, por mais que mereça, é livre de todo, que todo homem e toda mulher, por mais forte que brilhe sua estrela, tem de se submeter ao beneplácito social que o absolve ou o condena de vez, o que por seu turno sempre implica em sofrimento, em maior ou menor medida.

Vaughn, Jane Goldman e Mark Millar apostam numa espécie de romance de formação a fim de explicar o que passa com a Kingsman, prestando bons serviços à humanidade desde 1849. Charlie Hesketh, um rejeitado pelo alto comando da instituição, parece determinado a acertar com Eggsy, o novato vivido por Taron Egerton, que precisa do socorro do veterano Harry, o mais atilado, mas também não muito dado a pruridos éticos. Colin Firth lidera esse batalhão de talentos, meio perdido diante das centenas de milhões de mortos por todo o planeta, apenas “criminosos, um fardo para a sociedade”, brada alguém. Um atentado no show de Elton John conduz a trama seu momento mais tenso, ainda que aqui o segredo seja a graça leve do humor britânico. 


Filme: Kingsman: O Círculo Dourado
Direção: Matthew Vaughn
Ano: 2017
Gêneros: Comédia/Ação 
Nota: 8/10