Adaptação de clássico da literatura norte-americana, drama épico com Kirsten Dunst e Colin Farrell está na Netflix Divulgação / American Zoetrope

Adaptação de clássico da literatura norte-americana, drama épico com Kirsten Dunst e Colin Farrell está na Netflix

Desde os primeiros momentos de “O Estranho que Nós Amamos”, o espectador é imerso em uma variedade de sentimentos, que vão da inocência à quase selvageria. Sofia Coppola, com seu olhar perspicaz e sensível, comanda este projeto com uma compreensão profunda da complexidade humana, especialmente da mulher.

Coppola não se intimida com narrativas repletas de desafios, como a de John McBurney, o cabo do Exército da União, que, ferido em combate pelos Confederados do Sul durante a Guerra Civil Americana (1861-1865), foge de seu regimento. Este comportamento, inicialmente visto como covarde, rapidamente se revela mais complexo. A adaptação de Coppola do romance “The Beguiled” de Thomas P. Cullinan (1919-1995), publicado em 1966, suaviza alguns aspectos da trama original, mas mantém a essência traiçoeira dos personagens, ecoando a versão cinematográfica de Don Siegel (1912-1991).

Na Virgínia de 1864, em meio ao terceiro ano da Guerra Civil, a jovem Amy, uma das internas de um internato para meninas dirigido por Martha Farnsworth, encontra McBurney ferido sob um salgueiro. A interpretação de Oona Laurence e Colin Farrell é comovente, e a cinematografia de Philippe Le Sourd usa habilmente luz e sombra para capturar a atmosfera sombria e, ao mesmo tempo, cheia de vida. McBurney, já gravemente ferido, quase sucumbe ao longo caminho até a propriedade de Farnsworth, onde desmaia aos pés da diretora interpretada por Nicole Kidman, que chega ao local após ser chamada por Amy.

Nicole Kidman exibe seu talento ao retratar as diversas camadas da vilã, mesclando características de personagens como Grace Margaret Mulligan de “Os Outros” (2001) e Grace Stewart de “Dogville” (2003). Kirsten Dunst, uma colaboradora frequente de Coppola, representa um raio de luz na personagem Edwina, que se mantém distante da perturbadora presença masculina em um ambiente dominado pela ordem e silêncio femininos. Edwina, no entanto, é surpreendida ao se ver competindo pela atenção de McBurney com Alicia, a jovem provocante interpretada por Elle Fanning.

Coppola conduz a narrativa de forma a destacar a ambiguidade moral de cada personagem. “O Estranho que Nós Amamos”, na Netflix, evoca uma atmosfera de tragédia romântica, lembrando a literatura de Giovanni Boccaccio (1313-1375) ou Gregório de Matos (1636-1696), além de trazer à memória o lirismo cortante de filmes como “O Violinista que Veio do Mar” (2004), de Charles Dance. O desfecho do filme revela as complexidades internas dos personagens, e a solução encontrada por Farnsworth para lidar com McBurney pode até provocar uma sensação de alívio, refletindo a dualidade da natureza humana.


Filme: O Estranho que Nós Amamos
Direção: Sofia Coppola
Ano: 2017
Gêneros: Drama/Suspense
Nota: 9/10