Faça um favor a si mesmo: assista ao ganhador do Oscar 2024, que acabou de estrear na Netflix Divulgação / Synapse Distribution

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Evangelina, quatro anos; Ilya, dezesseis; Kyryl, dezoito meses. Em comum, essas três pessoas foram privadas de seus lares e de vidas que mal começaram durante as primeiras três semanas da invasão russa à Ucrânia, a partir de 24 de fevereiro de 2022. Aos cadáveres de Evangelina, Ilya e Kyryl, juntaram-se outros 24.997 corpos só durante a estada do jornalista ucraniano Mstyslav Chernov na costa norte do Mar de Azov, leste da Ucrânia, registrando em “20 Dias em Mariupol” a barbárie que volta os olhos do mundo para aquele país de 603.628 quilômetros  quadrados e cerca de 41,5 milhões de almas entre a Polônia e a Rússia, o oitavo mais populoso do Velho Continente, numa sinistra competição com a Faixa de Gaza desde 7 de outubro de 2023. 

Não há nenhum detalhe em específico para o qual chamar a atenção ao longo do horror capturado por Chernov, a não ser o sangue de inocentes que não para de respingar nos líderes de Estados Unidos e China, as grandes potências do Ocidente e da Ásia, pouco ou nada empenhadas em frear a personalidade tirânica e sádica de Vladimir Putin, para não mencionar também a cumplicidade baseada em ideologia míope de outras terras e a posição neutra e pusilânime de nações em desenvolvimento como o Brasil. A cada bloco de cenas, divididas em vinte tomos, cresce a revolta, a descrença de tudo, a impressão de que aquela gente está mesmo condenada ao genocídio, silencioso e que só perdura com a omissão de quem deveria tomar a frente e dar um àquele caos, pelas mãos da diplomacia ou à força. 

O diretor-roteirista grava tudo quanto consegue desde as horas inaugurais da ofensiva russa ao território ucraniano, quando deixa Kiev e viaja 847 quilômetros, imaginando que Mariupol seria uma das últimas localidades visadas por Putin. Quatro dias, imensos tanques com o “Z” de “para a vitória”, em russo, voltavam suas baterias para escolas, hospitais e maternidades, onde morreriam além de Evangelina, Ilya e Kyryl, também grávidas e seus bebês recém-nascidos ou ainda no ventre materno. A Revolução da Dignidade, os protestos concentrados na praça Maidan, em Kiev, contra o governo do presidente eleito Viktor Yanukovych; a anexação da Crimeia; a invasão de Donbass; a derrubada do voo MH17, que ia de Amsterdã a Kuala Lumpur, em Hrabove, por dois russos e um ucraniano; o cerco ao aeroporto de Donetski: Chernov esteve na cobertura dos episódios mais sangrentos da Europa Oriental dos últimos dez anos, mas afirma que nada é tão desumano e perverso quanto o que se vira em Mariupol. No 86º dia, as tropas de Putin tomaram a cidade. As baixas dos dois lados podem chegar ao primeiro milhão antes do terceiro ano do conflito. 


Filme: 20 Dias em Mariupol
Direção: Mstyslav Chernov
Ano: 2023
Gêneros: Guerra/Documentário
Nota: 10