Em apenas 4 dias, o novo filme de Guy Ritchie no Prime Video se tornou o mais assistido da atualidade em mais de 90 países Divulgação / Lionsgate Films

Em apenas 4 dias, o novo filme de Guy Ritchie no Prime Video se tornou o mais assistido da atualidade em mais de 90 países

A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) é o saco sem fundo da História. Quanto mais se mexe, mais surgem enredos sempre macabros, por óbvio, mas que também guardam notas divertidas a respeito dos vilões e, mais importante, dos heróis que ganharam fama durante esse triste momento da humanidade. “Guerra sem Regras” é mais um exemplo de quão longe podem chegar inúmeras versões para um mesmo fato, agora sob o auspício de Guy Ritchie. 

O texto de Ritchie, delirante, saboroso — e pleno de contradições —, coassinado com Arash Amel, Eric Johnson e Paul Tamasy, galvaniza os argumentos defendidos pelo ex-repórter de guerra britânico Damien Lewis em “Churchill’s Secret Warriors: The Explosive True Story of the Special Forces Desperadoes of World War II” (“Guerreiros secretos de Churchill: a explosiva história real dos desesperados das Forças Especiais da Segunda Guerra Mundial”, em tradução literal), de 2014, ainda que o também jornalista britânico Giles Milton tenha publicado em 2015 “The Ministry of Ungentlemanly Warfare — Churchill’s Mavericks: Plotting Hitler’s Defeat” (“O ministério da Guerra descortês — os rebeldes de Churchill: tramando a derrota de Hitler”, idem), a que o título original do filme faz menção, aliás. 

Para usufruir da experiência sem aborrecimentos desnecessários, quem assiste deve tornar-se cúmplice do diretor-roteirista e seus colaboradores e imaginar que, em janeiro de 1942, quando se passa a trama, a ofensiva a Pearl Harbor ainda não tivesse acontecido, uma vez que o Winston Churchill (1874-1965) de Rory Kinnear reclama a participação dos Estados Unidos nas batalhas. Como se sabe, o ataque deu-se em 7 de dezembro de 1941, mais de um mês após da declaração do Churchill de Ritchie, logo cobrar nexo cronológico aqui é tiro n’água.

Numa das cenas de abertura, Churchill aparece enviando pelo rádio uma mensagem ao esquadrão de sicários comandado por Gus March-Phillips (1908-1942), um oficial da reserva do Exército do Reino Unido, agora empenhado em perseguir nazistas com algum método e sem nenhum prurido de comiseração. March-Phillips leva consigo Freddy Alvarez, o especialista em bombas de Henry Golding; o sueco Anders Lassen (1920-1945), mestre no manejo de armas brancas vivido por Alan Richson, e o faz-tudo  Geoffrey Appleyard (1916-1943), com Alex Pettyfer quase sinistro em sua discrição. Os quatro tem de chegar a Fernando Pó (hoje Bioko), uma ilhota no Golfo da Guiné, costa da Nigéria, onde está atracado o navio que armazena suprimentos para os U-boats de Hitler, e para que se reduzam quaisquer chances de autossabotagem, a missão será integrada também por Marjorie Stewart (1919-2012), a espiã judia cujos pais foram os primeiros a sucumbir ao Terceiro Reich, e Richard Heron, um nigeriano que passa por dono de um bar-cassino em Fernando Pó.

É claro, repita-se, que não se pode esperar nada muito sério de um enredo tão mirabolante. Feita esta ponderação, o núcleo de March-Phillips, na pele de um Henry Cavill especialmente dedicado, duela com os personagens de Eiza Gonzalez e Babs Olusanmokun quanto à captar a atenção do público, a essa altura já rendido. Quando “Guerra sem Regras” vai se aproximando perigosamente de “Bastardos Inglórios” (2009), dirigido por Quentin Tarantino, ou mesmo de Os Doze Condenados (1967), levado à tela por Robert Aldrich (1918-1983), Ritchie, como é bem de seu feitio, chuta o balde e coloca Stewart e Til Schwieger, o general nazista magnificamente por Til Schwieger, entoando juntos “The Threepenny Opera” (1928), “Die Dreigroschenoper” no original — ou “A Ópera dos Três Vinténs”, o musical satírico de Kurt Weill (1900-1950) e Bertolt Brecht (1898-1956), expulsos da Alemanha em 1933 pela origem judaica e pela convicta profissão de fé no comunismo, respectivamente. Mas, para felicidade geral, mocinhos são exaltados e nazistas, bem, nazistas caem de podres.


Filme: Guerra sem Regras
Direção: Guy Ritchie
Ano: 2024
Gêneros: Ação/Comédia
Nota: 8/10