Descubra a obra-prima oculta de Todd Haynes no Prime Video e emocione-se profundamente Divulgação / Amazon Studios

Descubra a obra-prima oculta de Todd Haynes no Prime Video e emocione-se profundamente

Vira e mexe, a Era de Ouro de Hollywood renasce em filmes glamorosos, em que mulheres eram retratadas como criaturas submissas, lindas em sua meiguice de vestidos de seda estampados, cabelos amarrados em coques no alto da cabeça e estojo de maquiagem sempre a postos, matando o tempo em faxinas minuciosas, preparando assados suculentos ou atualizando o repertório de fofocas no salão de beleza onde encontravam as vizinhas com o mesmo cotidiano. “Sem Fôlego” não trata exatamente desse tempo mágico do cinema, mas poucos diretores sabem como ser nostálgicos exaltando a pieguice daquela bela época como Todd Haynes. 

Aqui, Haynes arrisca-se a cantar outros amores, que também sabem florescer, como a rosa no campo antes ressequido dos ventos da estiagem, e se o amor é verdadeiro, não tarda a vir uma torrente de outros sentimentos, até os tóxicos, para empregar uma palavra da moda. O filme, uma adaptação de Brian Selznick para seu livro homônimo publicado em 2011, sublinha o desejo de pertencimento de duas crianças, separadas por meio século, e disso ele entende. Também autor de “A Invenção de Hugo Cabret” (2007), que virou filme pelas mãos de Martin Scorsese em 2011, Selznick descobre jeitos novos de falar de velhas emoções e assim chega a outros públicos. Um golpe de mestre, sem dúvida.

Sem pressa, o mais cínico dos verdugos permite que nos locupletemos com o confortável sofisma que esconde uma promessa qualquer de felicidade, sendo que o gênero humano está essencialmente condenado a perseguir a quimera de ser feliz, já que o mundo é, como na caverna de Platão (428 a.C — 348 a.C), só um simulacro das projeções muito íntimas de cada um, de conceitos eivados de nossas idiossincrasias as mais diversas, que por seu turno mantêm-nos mais e mais encafuados em nossos sonhos e delírios. Realidade das mais incontestáveis dentre todas, a ditadura do tempo se estende para além de nossa vã filosofia e de nossa exígua compreensão, e, enquanto houver alguma forma de vida pulsando no caos maravilhoso do universo, ela sempre haverá de existir. O problema fundamental do homem não é o avanço despótico das horas, mas encontrar um meio, por mais improvável que seja, de fazer-se-nos revelar o gozo onde alastra-se o desespero.

Com o encontro de Ben Wilson, um garoto da zona rural de Gunflint, Minnesota, em 1977, cuja mãe acaba de morrer num acidente de carro, com Rose Mayhew, uma menina surda de nascença e calada na pequena Hoboken, na Nova Jersey de 1927, Haynes e Selznick provam que o passar dos anos é um detalhe insignificante para que duas almas feitas uma para a outra unam-se, afinal. O feitiço se completa com as performances de Oakes Fegley e Millicent Simmonds, capazes de manter o espectador na torcida por eles até o fim, e cá para nós, tanto romantismo vem a calhar em dias de tanto descrédito cínico em tudo. Todd Haynes sabe das coisas.


Filme: Sem Fôlego
Direção: Todd Haynes
Ano: 2017
Gêneros: Aventura/Drama/Mistério
Nota: 9/10