Temas espinhosos a exemplo de xenofobia e racismo, ou urgentes, como a independência das mulheres e a necessidade de políticas públicas para manter os jovens longe do consumo e do tráfico de drogas pipocam em “As Passageiras”, dispostos por Adam Randall num tropo surrado, mas envolvente. À história de um garoto latino tentando fazer a vida e ficar longe de encrenca, o diretor acrescenta elementos fantásticos, à luz de onipresentes néons lilases, rosas e azuis a que a fotografia de Eben Bolter trata de dar o merecido destaque, que ora suavizam a angústia do personagem central, ora jogam-no nos braços sedutores de suas carnífices, duas vampiras festeiras que não dispensam sangue novo. As performances certeiras de um elenco afinado contornam as naturais limitações do roteiro de Brent Dillon, que depois da abertura insiste em conduzir a narrativa para um terror pouco nuançado, não obstante o enredo ter mais possibilidades.
Benny talvez tenha a pretensão de ganhar a vida como skatista, mas não deixa de comparecer às aulas na faculdade — ainda que acabe por pegar no sono em uma ou outra ocasião. Ele parece ter sublimado a realidade de ter sido criado sem os pais, graças à dedicação da avó interpretada por Marlene Forte, e Jorge Lendeborg Jr. vale-se dessas fragilidades do protagonista para aos poucos justificar os pequenos deslizes de Benny, às vezes atordoado, às vezes perdido, mas sempre judicioso. Ele julga que a volta de Jay, o meio-irmão vivido por Raúl Castillo, dono de uma empresa de transporte particular, seja a oportunidade perfeita para começar uma lenta ascensão social, e o convence a deixá-lo buscar as passageiras do título, e a partir desse ponto, o filme assume afinal sua natureza cômico-terrífica.
Blaire e Zoe entram no carro e os três aventuram-se pelas altas rodas privadas de Los Angeles, elas zanzando pelos salões, ele, do lado de fora, à espera. Blaire, a menos experiente, reforça o potencial sádico da outra, há séculos fugindo da luz e evitando igrejas, e entre uma e outra farra, elas se encarregam de tomar a alma de incautos como Benny, que não oferece tanta resistência assim. Debby Ryan e Lucy Fry inauguram a face verdadeiramente macabra desse terror absurdo sem que se percam de vista os lances mais engraçados. A essa altura, Lendeborg Jr. já está à vontade na pele de um anti-herói que se entende feito para a derrota, massacrado pela gente branca e cruel que o quer parasitar. Sina de que não escapa nem mesmo depois de, finalmente, aceitar vender a alma às bebedoras de sangue que atravessam seu caminho.
Filme: As Passageiras
Direção: Adam Randall
Ano: 2021
Gêneros: Terror/Ação
Nota: 8/10