O filme aplaudido por 5 minutos em Cannes e considerado o mais emocionante dos últimos 2 anos está na Netflix

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O início sereno de “Aftersun” pode enganar o espectador. Em um quarto de hotel, um pai e sua filha discutem sua relação. A menina, com apenas nove anos, tenta esconder sua pouca idade, enquanto vê seu pai, que tem cerca de trinta anos, como um idoso. Ela observa de perto suas manias antigas, seus sonhos frustrados e seu semblante melancólico, marcado pelo recente divórcio, que parece afetar todas as áreas de sua vida, como o odor que exala de um corpo em decomposição.

Charlotte Wells explora suas próprias memórias ao delinear os personagens Calum e Sophie, os protagonistas infelizes de seu cativante filme. É evidente de onde vem essa autenticidade destrutiva e terapêutica, que faz com que muitos espectadores se identifiquem de imediato. Aos dezesseis anos, a diretora perdeu o pai. Apesar de já sentir a ausência dele, uma vez que morava em Nova York e ele em Londres, essa separação definitiva a devastou.

O roteiro de Wells equilibra passagens dolorosas com momentos de esperança, permitindo aos personagens sonhar com um futuro melhor. Utilizando poesia e técnica, ela conta a história comum de pessoas comuns, e é isso que torna seu trabalho tão emocionante e acolhedor.

Em uma viagem à Turquia, Calum e Sophie desfrutam de um dos raros momentos juntos em um resort econômico. Enquanto isso, Wells dá pistas sobre o verdadeiro estado emocional de Calum, como ao mostrá-lo acendendo um cigarro após lutar com o gesso em seu braço. A reserva incluía duas camas, mas devido a um erro da gerência, receberam um quarto com apenas uma cama. Ele não considera a possibilidade de ambos dormirem juntos, talvez em parte devido à crescente vigilância do politicamente correto.

O filme não se rende completamente, e na cena seguinte, em uma manhã ensolarada, pai e filha estão no parque aquático. Calum pede bebidas no bar enquanto Sophie se diverte no fliperama, interagindo de maneira ambivalente com um garoto, tentando chamar sua atenção sem muitos maneirismos. Paul Mescal e Frankie Corio se alternam na preferência do público, cada um impondo suas dores particulares.

Sophie, assim como Wells, não consegue esconder a tristeza pelo divórcio dos pais, mostrando que viver com a mãe não é tão fácil. Calum, por outro lado, ouve as queixas da filha, mas não sabe como direcionar sua própria vida, cogitando abrir um café com alguém chamado Keith, sem convencer nem a si mesmo.

“Aftersun” se coloca ao lado da menina desde o início, mas quando Celia Rowlson-Hall assume a personagem, fica clara a necessidade de Wells em defender sua visão dos eventos, tanto os reais quanto os percebidos por uma criança. A cinematografia de Gregory Oke realça a aura onírica do filme, especialmente na cena em que a Sophie adulta revisita o passado e vê Calum perdido, em um transe hipnótico na pista de dança, contorcendo-se sob luzes estroboscópicas. Pensei nos meus próprios pais, também jovens demais para assumir compromissos além de si mesmos, e senti pena deles, como já havia sentido em outras ocasiões. Talvez seja isso que nos espera depois do sol.


Filme: Aftersun
Direção: Charlotte Wells
Ano: 2022
Gêneros: Drama/Coming-of-age
Nota: 9/10