Ser jovem nunca foi fácil. A juventude se nos apresenta como um ajuntamento de autocobranças, satisfações que achamos que devemos ao universo — quando o universo não faz a menor ideia de quem somos, e não tem nenhuma pretensão de fazê-lo —, dilemas existenciais característicos, muitos profundos como um balde, e dúvidas quanto ao que reserva-nos o futuro, essas de fato preocupantes. Tememos ser surpreendidos pelos tantos inesperados da vida sem que ainda estejamos prontos, o que, como todos sabemos os que já passaram de determinada idade, sói acontecer com uma frequência meio enjoativa.
O momento em que somos impelidos a deixar a casa paterna e materna e nos lançar ao mundo, sem qualquer certeza sobre se resistiremos ao arrojo da nossa própria ousadia, vem num jato; é quando sentimos que, se não tomamos posse de nosso destino naquele instante mesmo e decidimos o que quer que seja, depois poderá ser irremediavelmente tarde demais. Bennett Russell e Lona Skinner, os protagonistas de “Doce Argumento”, disputam palmo a palmo a liderança no Clube de Debates da Escola Preparatória Hemlock, sem suspeitar que tanta animosidade, claro, pode significar outra coisa. A comédia romântica adolescente de Ben Shelton não tem nada de mais e nem de novo, mas o roteiro de Chad Klitzman trata de não deixar que o espectador se desinteresse pela história, socorrendo-se também de veteranos que sabem muito bem o que estão fazendo.
Comings-of-age, dramas que se desdobram sobre os conflitos ao longo do amadurecimento de um personagem, sempre têm muito a nos dizer a respeito de nós mesmos. Em menos de um segundo passam-se décadas e já não parecemos mais tão novos; esperamos que alguém nos desperte antes de sair, e impeça que o sol se ponha nas nossas costas sem que possamos nos defender. Jacob Latimore e Sami Gayle levam a sério a disputa entre Bennett e Lona, e na sala de Kathy, a orientadora pedagógica de Helen Hunt, mostram que sua rivalidade não é tão incontornável assim.
Qualquer um com mais de trinta anos percebe logo onde vai dar tanta implicância, tanto deboche, tanta competição, e Shelton é hábil em manobrar os sentimentos tumultuados desses românticos inconfessos, sem que seja necessário pesar a mão e mencionar que a garota é branca e ele, negro — embora esse pensamento seja uma das primeiras coisas que nos vêm à cabeça. Os dois entendem que, juntos, seus domínios podem ir muito além de suas limitadas possibilidades, e dessa ambição, inocente à primeira vista, eclodem mil desdobramentos, ocorrências colaterais que os fazem chocar-se contra seus próprios sonhos. E quem é capaz de vê-los com maus olhos por isso?
Filme: Doce Argumento
Direção: Ben Shelton
Ano: 2018
Gêneros: Comédia/Romance/Coming-of-age
Nota: 8/10