A ideia de que a juventude sem sucesso e o sucesso sem juventude são conceitos repudiados cresce a cada dia. Quando acrescentamos as interações midiáticas a essa equação, vemos que quanto mais cedo alguém se insere na cultura pop, convencendo-se de sua originalidade e inovação, mais reforça a noção de que está criando algo inteiramente novo, rejeitando tudo que já existiu.
Para essas pessoas, um escritor esquecido em uma casa em ruínas, prestes a ser despejado, representa o fracasso e a inutilidade da sofisticação intelectual. “Best Sellers — A Última Turnê”, disponível na Netflix, explora profundamente essa temática, especialmente após o desenrolar do conflito principal. A diretora Lina Roessler apresenta um editor obstinado, cujo caminho se cruza com o de um escritor recluso. Dessa relação forçada e repleta de momentos tensos e quase trágicos, surge uma amizade sólida, ancorada no talento que redime ambos.
Michael Caine se mostra o intérprete ideal para dar vida a este personagem. Aos 88 anos, ele continua a encantar, demonstrando que seu vigor artístico permanece intacto. No papel de Harris Shaw, um homem desiludido com a modernidade e muito à vontade com sua máquina de escrever Remington em meio a pilhas de livros, uísque e charutos, Caine domina o roteiro de Anthony Grieco. O personagem de Shaw vive em um mundo próprio, um espaço abafado e sombrio, capturado pela lente de Claudine Sauvé.
O equilíbrio dessa rotina é quebrado pela chegada de Lucy Stanbridge, interpretada por Aubrey Plaza. Lucy, herdeira de uma editora à beira da falência, invade o universo de Shaw em busca de uma dívida antiga. Plaza e Caine desenvolvem uma dinâmica cativante, com Lucy enfrentando o veterano de igual para igual, mesmo sabendo que pode ser surpreendida a qualquer momento.
Há um pequeno deslize no roteiro sobre se os 25 mil dólares pagos a Shaw foram um adiantamento por um romance que nunca foi escrito ou se eram relativos a outro trabalho já entregue. Contudo, esse detalhe não compromete a trama, e Shaw acaba aceitando retomar a carreira com um manuscrito intitulado “O Futuro é Pornográfico”. A situação se complica quando ele é obrigado a embarcar em uma turnê desastrosa por cidades pequenas da América, tornando a palavra “balela” sua marca registrada.
Num relato que Roessler dedica a seu pai, a diretora explora as relações entre dois estranhos que se revelam mais semelhantes do que gostariam. A crítica à ascensão das pseudocelebridades e à superficialidade da cultura pop é feita de forma natural, conferindo ao filme um desfecho agridoce de morte e renascimento, temas difíceis para uma sociedade que evita confrontar essas realidades.
Filme: Best Sellers — A Última Turnê
Direção: Lina Roessler
Ano: 2021
Gêneros: Comédia/Drama
Nota: 8/10