Perdas devastadoras, daquelas que nunca deveriam acontecer, ocasionalmente ocorrem na vida. Algumas são tão severas que parecem desafiadoras à própria natureza. A experiência de perder um filho se insere nessa categoria, sugerindo que qualquer força controladora do universo deveria ser responsabilizada. “Um Ninho Para Dois” é um filme que explora o tema do luto através da história de Jack (Chris O’Dowd) e Lilly (Melissa McCarthy), um casal que enfrenta a tragédia de perder sua filha, Katie, para a Síndrome da Morte Súbita do Lactente (SMSL). Este fenômeno, aterrador por sua imprevisibilidade, afeta cerca de 5 em cada 10 mil bebês no Brasil, conforme dados do MD Saúde.
A SMSL é um temor constante para muitas mães de bebês. Frequentemente, elas relatam a dificuldade de dormir à noite, despertando a cada poucos minutos para verificar a respiração de seus filhos. A ciência ainda não oferece uma explicação definitiva para o falecimento súbito de bebês durante o sono, embora reconheça a existência de fatores de risco.
Dirigido por Theodore Melfi, o filme retrata Jack e Lilly em sua luta para lidar com o luto e continuar vivendo. Jack, afundado em uma depressão profunda, tenta o suicídio e acaba se internando em uma clínica psiquiátrica, afastando-se de sua casa, seu trabalho e da vida anterior à tragédia. Lilly, por outro lado, busca seguir em frente, dedicando-se ao trabalho e à jardinagem. Ela se desfaz de todos os pertences de Katie e tenta suprimir as lembranças da filha como uma forma de aliviar sua dor.
Lilly encontra algum consolo na jardinagem, uma metáfora para sua tentativa de reconstruir a vida e reencontrar a felicidade. Enquanto ela se esforça para cuidar de sua família, Jack se afunda ainda mais no desespero, ressentido com a forma como sua esposa tenta seguir adiante. Para ele, seguir em frente significa esquecer Katie. No meio desse tumulto, eles precisam descobrir uma maneira de se reconectar e entender as diferentes formas como cada um enfrenta sua jornada de tristeza e recuperação. Para Lilly, a empatia chega na forma de um passarinho que começa a aparecer em seu jardim.
O filme utiliza cores para simbolizar as emoções dos personagens. Lilly é associada ao dourado, representando sua busca pela felicidade e um retorno à normalidade, similar ao caminho de tijolos amarelos de Dorothy. Jack, por sua vez, está envolto em tons de azul, refletindo tristeza, depressão e desespero – uma escolha deliberada, já que “blues” em inglês também significa melancolia. À medida que a trama avança, as cores que envolvem Jack começam a mudar, simbolizando sua transformação.
Em uma entrevista ao Screen Rant, Melfi revelou que a escolha de O’Dowd e McCarthy se deve não apenas à amizade, mas também à habilidade dos atores em transitar entre a comédia e o drama. Isso é crucial, pois o filme mescla momentos de leveza com passagens de intensa tristeza. Filmado durante a pandemia de coronavírus, Melfi comentou que o filme capturou bem o sentimento daquela época, onde a tristeza era palpável, mas seguir em frente era necessário.
Originalmente, os papéis dos personagens eram invertidos, com Lilly sofrendo de depressão enquanto Jack seguia em frente. No entanto, Melfi achou que isso não fazia sentido, dado que as mulheres de sua vida — sua mãe, esposa e filha — sempre se mostraram as mais fortes e determinadas. Ele então solicitou ao roteirista, Matt Harris, que invertesse os papéis dos personagens.
“Um Ninho Para Dois”, na Netflix, é um drama delicado e emocional, temperado com momentos de ternura e humor. É uma jornada profunda e comovente, que certamente tocará o coração dos espectadores.
Filme: Um Ninho Para Dois
Direção: Theodore Melfi
Ano: 2021
Gênero: Drama/Comédia
Nota: 8/10