Riccardo Scamarcio é o Vito Corleone de Renato De Maria faz em “Nada Santo” (2019), o seu “O Poderoso Chefão” particular, a que, como Francis Ford Coppola, também conferiu uma natureza de épico, fundado sobre a figura do protagonista. Em “Desaparecidos na Noite”, Scamarcio torna a encarnar um tipo suspeito, cuja imagem obscura se vai iluminando à medida em que aceita tomar numa empreitada ilegal para reaver os filhos, que crê terem sido vítimas de um sequestro enquanto assistia a uma partida de futebol na televisão, depois do fim melancólico e brusco de um casamento que parecia feliz. Os roteiristas Patxi Amezcua, Alejo Flah e Luca Infascelli esticam o quanto podem a ideia do homem frágil, mais e mais confuso diante de uma pletora de eventos misteriosos que se sucedem entre eles, as crianças e a mãe delas, sua ex-esposa, a grande vilã desse noir de lenta combustão.
As escolhas, de uma forma ou de outra, sempre pautam a vida do homem. Nosso destino está subordinado ao que fazemos do agora, condição essencial para compreender — e aceitar — o porvir. Casamentos podem ser a oportunidade ideal para que se unam não duas pessoas que trocam juras de amor eterno que não resistem à pálida luz da alvorada, mas paranoias de vidas fraturadas em alguma curva imprecisa do caminho, e, por uma razão compartilhada só pelos dois, são justamente essas suas debilidades que fazem com que o erro imperdoável da união transforme-se num vínculo que dura indefinidamente, quiçá para além da vida, e que desconcerta pela lealdade com que os cônjuges enxergam-se um ao outro.
Quando compreendem, não raro à custa de muitas batalhas contra a intransigência dos titânicos moinhos de vento a rondar sua vida em comum, que estão juntos para descobrir o que, afinal, os impele a seguir tentando manter sua história, sufocando fantasias pueris sobre amor eterno e tórridos folguedos de alcova para além da idade conveniente, amantes — ou esses dois elementos que, queiram ou não, viram um único ente às vistas da sociedade — têm uma possibilidade exponencialmente maior de serem felizes, ainda que essa bonança nunca se vá completar e pareça sempre necessitada de um reforço. Até que a fonte seca de vez.
O Pietro de Scamarcio e Elena, a psiquiatra americana vivida por Annabelle Wallis, moram em Puglia, a cidade dele, e por aí se começa a ter uma ideia quanto aonde De Maria quer chegar. Os desentendimentos mais e mais frequentes do casal, por causa do vício em jogo do marido, aquece o espírito da audiência para o que se segue, e quando as crianças somem e o Pietro é instado a procurar Nicola, o ex-melhor amigo interpretado por Massimiliano Gallo, agora um bem-sucedido chefão da Camorra, a máfia do sul da Itália, já se sabe onde a história vai dar. Assim mesmo, o diretor compõe uma reviravolta estimulante para olhos destreinados, cumprindo o que parecia ser seu propósito desde o começo.
Filme: Desaparecidos na Noite
Direção: Renato De Maria
Ano: 2024
Gêneros: Drama/Suspense
Nota: 8/10