Embora seja importante que pessoas no espectro estejam sendo representadas nas telas, ainda me intriga o motivo de precisarem transformá-las em caricaturas. “Goyo”, escrito e dirigido por Marcos Carnevale, narra a história de amor entre Goyo (Nicolás Furtado) e Eva (Nancy Dupláa), um guia e uma segurança de um museu no centro de Buenos Aires.
Embora compartilhem o mesmo local de trabalho, eles não são muito similares. Goyo é um rapaz inexperiente no amor, dentro do espectro autista e pertencente a uma família de classe média alta, onde todos se destacam de alguma forma. Sua irmã, Saula (Soledad Villamil), é uma pianista clássica famosa, enquanto seu irmão, Matute (Pablo Rago), é um talentoso chef de cozinha. Os três são solteiros e moram juntos em uma mansão bem decorada. Goyo, que tem uma inteligência acima da média, também possui talento para a pintura, paixão que não o tem inspirado nos últimos anos, até conhecer Eva e voltar a pintar.
Eva, por sua vez, é uma mulher mais velha, separada de seu marido agressivo, com um filho adolescente, Cuti (Balthazar Murillo), e um garotinho doce e adorável, Tato (Zeus Milo). Ela é uma mulher comum, sem nenhum talento especial e sem privilégios. Moradora de um bairro popular, ela luta para pagar as contas e cuidar dos filhos como mãe solteira, após expulsar o marido, Tato (Zeus Milo), de casa.
Há pontos positivos e negativos nessa comédia romântica que valem ser citados. O humor heterodoxo e a forma como Eva é retratada são muito interessantes e divertidos. Ela não é um tipo de “manic pixie dream girl”, uma versão romantizada da mulher perfeita e superficial que traz sentido para a vida do mocinho. Pelo contrário, é uma personagem bem desenvolvida, uma mulher imperfeita em luta constante, uma mãe de família tentando se afastar de seu ex-marido tóxico.
Na primeira cena em que vemos Eva (também a primeira vez que Goyo a vê), ela está do outro lado da avenida, se molhando sob uma tempestade, lutando contra um guarda-chuva quebrado por causa do vento forte e soltando palavrões. Goyo a observa em câmera lenta, insinuando uma paixão imediata.
Eva não é jovem demais, não possui uma beleza inatingível, não é otimista ou possui um humor vibrante que contagia a todos. Ela é perfeitamente imperfeita, uma mulher com a qual todas as mulheres podem se identificar.
A primeira vez que ela vê Goyo também é icônica. Ele se aproxima com os olhos arregalados e tem uma crise de pânico dentro do metrô. Naturalmente, ela sente medo e acredita estar sendo perseguida por um maníaco. Quando ele sai do vagão desesperado, ela mostra o dedo pela janela. Eva é incrível não porque solta palavrões ou mostra o dedo, mas porque não é uma mulher idealizada, frágil e sem personalidade.
No entanto, Goyo parece um estereótipo simplista. É estranho como o cinema insiste em encaixar papéis de pessoas neurodivergentes usando atores que nunca parecem interpretá-los de forma natural. Ainda assim, a maneira como o filme aborda o relacionamento curioso e sincero entre duas pessoas tão diferentes é interessante e eficaz, especialmente pela atuação extraordinária de Dupláa.
Filme: Goyo
Direção: Marcos Carnevale
Ano: 2024
Gênero: Drama/Comédia/Romance
Nota: 8