Último dia para ver na Netflix o ganhador de Cannes, com atriz envolvida em escândalo que abalou a França Julian Torres / Les Films Velvet

Último dia para ver na Netflix o ganhador de Cannes, com atriz envolvida em escândalo que abalou a França

Viver em sociedade exige que sigamos normas e regras estabelecidas muito antes de nossa chegada ao mundo, uma necessidade para coexistirmos de forma minimamente harmônica. No entanto, essa conformidade raramente se associa a prazer. Somos, biologicamente, animais como qualquer outro, refletindo a natureza que nos gerou, com sua indisciplina, selvageria e caos. Aceitar essa falta de ordem e compreender o mundo em sua verdadeira essência —  insensível, resistente à delicadeza e avesso às reações civilizadas —  é uma estratégia para minimizar o sofrimento.

Ainda assim, possuímos a capacidade de aspirar a um destino diferente, uma vida digna que se alinha à nobreza do propósito de viver. Esse ideal tem sido um sonho antigo da humanidade, desejando estruturar um conceito de harmonia interior em meio ao caos, à pulsão de morte e à destruição implícita em nossa existência. Algumas pessoas lidam melhor com essa realidade do que outras, especialmente na juventude, quando a inconsequência nos permite errar repetidamente, transformando nossos erros em aprendizado.

A narrativa de “A Prima Sofia” (2019), dirigida por Rebecca Zlotowski, explora a dualidade entre sensualidade e filosofia através das experiências de duas jovens. Enquanto uma delas se bronzeia na costa oeste da França, a outra, fascinada e atônita, reflete sobre seu próprio futuro. O filme apresenta Sofia, interpretada por Zahia Dehar, como a personificação do cinismo jovem e despreocupado, contrastando com sua prima Naïma, interpretada por Mina Farid, que leva uma vida mais modesta e pacífica com sua mãe, Dounia, uma camareira.

Sofia, com sua sede de viver, apetite sexual insaciável e estilo provocante, é a antítese da angelical Naïma. Zlotowski habilmente constrói essa dualidade visual, sugerindo que, apesar das aparências, as duas têm mais em comum do que percebem. As interações com Andrés e Philippe, personagens de Nuno Lopes e Benoît Magimel, destacam essa tensão, especialmente nas cenas no iate no Mediterrâneo, onde a angústia de ambas se revela de formas opostas.

O roteiro, coescrito por Zlotowski e Teddy Lussi-Modeste, explora a estética das protagonistas, especialmente Dehar, que já foi centro de um escândalo sexual. O sexo e o poder que ele evoca são temas centrais, com Sofia exercendo um fascínio irresistível, porém transitório, sobre todos. A narrativa culmina com Naïma assumindo sua identidade de forma decisiva, destacando a autonomia de cada personagem em escolher seu próprio caminho. “A Prima Sofia” evita moralismos e tragédias, focando na liberdade individual.


Filme: A Prima Sofia
Direção: Rebecca Zlotowski
Ano: 2019
Gêneros: Drama/Comédia/Coming-of-age
Nota: 8/10