O suspense mais inteligente, emocionante, selvagem e imprevisível da Netflix Divulgação / Lionsgate Films

O suspense mais inteligente, emocionante, selvagem e imprevisível da Netflix

Em 2017, o mundo se espantou com uma nova modalidade de jogo virtual cujo propósito maior era promover desafios arriscados entre seus participantes, quase todos adolescentes entre treze e dezessete anos. Depois de lançado por uma rede social russa, o Baleia Azul virou febre nas herméticas comunidades de jogadores online, e daí para que de fato as partidas caíssem no gosto desse público levou o tempo de um clique, arrastando jovens usuários para um terror vívido, que não raro degringolava em morte. 

Tal como ocorreu na dureza da realidade, “Nerve — Um Jogo Sem Regras” é mesmo uma diversão inconsequente, que no terceiro ato ganha fôlego de história sobre algo mais que uma juventude perdida, ansiosa por qualquer coisa que a arranque de sua paralisia diante de um mundo vasto demais, que não podem compreender. O roteiro de Jessica Sharzer, a partir no romance homônimo de Jeanne Ryan publicado em 2012, realça essas incongruências dos verdes anos ao mesmo tempo em que deixa o espectador de sobreaviso quanto às reviravoltas que cercam aqueles excêntricos personagens.

Autodescobertas exigem muito mais que persistência, e a depender da extensão do trauma toda medida de fé que se consiga reunir ao longo de uma vida talvez não seja o bastante. Em qualquer parte do mundo, adolescentes gostam de roupas largas, cabelos extravagantes, penduricalhos espalhafatosos, música barulhenta e liberdade, às vezes sem a justa contrapartida e sem o devido merecimento. As imperfeições de um corpo em mutação constante e sem método são menos perturbadoras que a efervescência de uma alma que sofre por tudo e por nada, que começa a se saber limitada, mas ainda assim não renuncia à necessidade de conquistar tudo quanto existe sem perder o que quer que seja. 

Tommy, um nerd viciado em dispositivos tecnológicos e adepto de uma visão um tanto inconvencional no que respeita à presença das máquinas no cotidiano do homem, está encantado por Vee Delmonico, uma linda loira que conta os dias para concluir o ensino médio e embarcar para a CalArts, a escola de artes cofundada por Walt Disney (1901-1966) em 1961, uma das mais renomadas dos Estados Unidos, em Santa Clarita, ao norte de Los Angeles. 

Como também fazem em “Power” (2020), Ariel Schulman e Henry Joost cruzam as voláteis fronteiras do íntimo e do mercadológico numa questão cada vez mais espinhosa, que liga saúde mental, a irreversível onipresença dos computadores e uma montanha de dinheiro que vai parar na conta de quem vence as provas suicidas que os outros competidores lhe impingem, os tais desafios.

Emma Roberts incorpora os vários estágios da narrativa, como se tratasse mesmo de um jogo eletrônico, passando da amargura por não despertar o interesse de J.P., o capitão do time de futebol do colégio vivido por Brian Marc, do desapontamento com Sydney, a melhor amiga interpretada por Emily Meade, ótima, e chegando à redenção pelo amor de Ian. Roberts e Dave Franco compõem o par perfeito, se é que isso existe na vida como ela é, prestando-se a alívio romântico num enredo sobre comportamentos nefastos. Mais menos como se dá o modo operante das redes sociais, a Baleia Azul de hoje.


Filme: Nerve — Um Jogo Sem Regras
Direção: Ariel Schulman e Henry Joost
Ano: 2016
Gêneros: Thriller/Aventura
Nota: 8/10