Fenômeno de bilheteria, filme que arrecadou 3,5 bilhões de reais nos cinemas está na Netflix Divulgação / Lionsgate Films

Fenômeno de bilheteria, filme que arrecadou 3,5 bilhões de reais nos cinemas está na Netflix

O cinema de ficção científica vem sendo um meio cada vez mais robusto para explorar reflexões filosóficas sobre o destino incerto da humanidade, e “Jogos Vorazes” exemplifica bem essa tendência. Apesar de seu caráter controverso, as distopias proporcionam um alívio notável para aqueles menos conformados com o caos incessante do mundo. A ideia de que ainda não atingimos o fundo do poço moral e econômico que parece nos esperar, como um camundongo hipnotizado por uma serpente, pode ser atribuída a alguma força maior que se compadece de nós.

Essa força, talvez, permite que continuemos a existir em nossas agonias individuais até que a morte nos alcance, oferecendo uma solução definitiva para muitos que já se afundaram em desespero e consternação. Eventualmente, todos os ciclos de desespero cessam temporariamente, e novas esperanças e desejos surgem, perpetuando o ciclo interminável das misérias humanas. Gary Ross, com um orçamento colossal, um elenco bem afinado e uma história que se sustenta apesar de algumas incoerências, inicia uma saga que se estende por mais três filmes, muito graças à dedicação de uma protagonista promissora que já mostrava sinais de que iria longe.

A luta pela sobrevivência nos obriga a adotar uma postura mais agressiva em relação aos outros, e essa faceta acaba por se integrar à nossa natureza com a ajuda das dificuldades extremas que enfrentamos. Nessas condições, a vida se torna uma arena onde é preciso matar ou morrer. As pessoas são despojadas de seu arbítrio e sensibilidade, tornando-se extensões da consciência coletiva, incapazes de pensar por si mesmas e forçadas a se submeter a expedientes vis, não por covardia, mas por falta de apoio.

O roteiro de Gary Ross, Billy Ray e Suzanne Collins, autora dos livros, retrata uma América do Norte devastada por uma hecatombe — seja um conflito nuclear, uma guerra civil de proporções descontroladas ou a pura incompetência e psicopatia dos governos. Os sobreviventes reagrupam-se em Panem, uma nação governada pelo Capitólio e dividida em doze distritos. O filme, com uma duração de quase duas horas e meia, entrelaça elementos políticos que variam em significado ao longo da trama. O público descobre que cada distrito deve enviar dois residentes — um rapaz e uma garota — para lutar até a morte em uma arena, reminiscente dos gladiadores da Roma Antiga.

Gary Ross preserva a atmosfera de fábula apocalíptica dos livros de Collins, focando em como os tributos do Distrito 12, o mais pobre, se preparam para o confronto mortal. A trama começa a ganhar ritmo com a construção do relacionamento entre Katniss Everdeen, interpretada por Jennifer Lawrence, e Peeta Mellark, vivido por Josh Hutcherson. Inicialmente adversários, eles são forçados a perceber a conexão entre eles, uma relação que desafia o espetáculo macabro em que são peças centrais. Antes de chegarem ao sangrento clímax do torneio, os tributos enfrentam testes menos óbvios e igualmente cruéis, incluindo aparições no talk show de Caesar Flickerman, interpretado por Stanley Tucci, que rouba a cena com sua performance insinuante e enigmática.

“Jogos Vorazes”, na Netflix, não é apenas uma história sobre sobrevivência física, mas também uma crítica social e uma reflexão sobre a natureza humana em situações extremas. A série explora temas como a luta pelo poder, a resistência contra a opressão e a busca por identidade em um mundo brutalmente dividido entre opressores e oprimidos. Através de sua narrativa e personagens, o filme desafia os espectadores a refletirem sobre seu próprio mundo e as estruturas de poder que o governam, fazendo de “Jogos Vorazes” uma obra relevante e impactante, tanto como entretenimento quanto como comentário social.


Filme: Jogos Vorazes
Direção: Gary Ross
Ano: 2012
Gêneros: Thriller/Ficção científica/Aventura
Nota: 9/10