Um dos filmes mais adoráveis e encantadores de 2024 chegou à Netflix, e você ainda não assistiu Divulgação / Netflix

Um dos filmes mais adoráveis e encantadores de 2024 chegou à Netflix, e você ainda não assistiu

Muitas das respostas de que o homem precisa estão nos contos de fadas e sua leitura saborosamente excêntrica do mundo e da natureza humana. O passar dos anos só faz cristalizar as lições que essas narrativas vesanas dão a qualquer um que se abra para o que elas têm a dizer, e “A Academia do Sr. Kleks” é outro dos tantos exemplos a confirmar tal impressão.

Baseado no livro homônimo de Jan Brzechwa (1898-1966) publicado em 1946, o roteiro de Krzysztof Gureczny e Agnieszka Kruk se divide entre Nova York, Japão, as planícies da Ucrânia, México e São Paulo e volta à megalópole americana relatando as desventuras de Ada Niezgódka, a Ada do Contra, perdida em meio a vontades as mais básicas de achar-se no mundo, começando por rever o pai, que a abandonara com a mãe quando ela era ainda pouco mais que um bebê.

O diretor Maciej Kawulski centra seu filme nessa menina subestimada por todos, até por si mesma, enquanto cozinha em fogo baixo a virada da personagem central, seguindo os passos de quem tornou-se célebre na arte de dizer verdades incômodas, fesceninas até, mas nunca desprezíveis.

Kawulski não explica a contento por que Ada e a mãe se radicaram na Grande Maçã, mas isso não tem lá muita importância: Mateusz, o gigantesco pássaro antropoforme de Sebastian Stankiewicz, tem o condão de descobrir possíveis candidatos a alunos da tal academia em qualquer parte do mundo, e chega a essa pequena anacoreta depois de um voo rasante em que se segura para não largar seus imensos dejetos na cabeça de um nova-iorquino desavisado.

Um deslize no texto de Gureczny e Kruk é nunca se estender sobre as razões pelas quais Ada e a Anna, a mãe, interpretada por Agnieszka Grochowska, tornaram-se tão hostis uma à outra, mas esse lapso é parcialmente coberto pelo carisma de

Antonina Litwiniak, a ponto de ninguém estranhar quando ela aceita partir com Mateusz rumo à terra onde Kleks ministra seus cursos de magia real, bem a propósito do que diz o cartaz que segura um mendigo numa esquina do Brooklyn.

O diretor passa os 129 minutos, duração um tanto excessiva, batendo na tecla do desajuste fundamental de certos indivíduos, e a Academia de Ambrozy Kleks, vivido por Tomasz Kot, evidentemente, é onde se refugiam essas aves raras.

Kawulski faz de seu longa uma estimulante viagem pelas historietas fantásticas da velha Europa, dando maior ênfase a “Branca de Neve”, um dos contos de fadas que melhor simbolizam a tradição germanófona, compilado pelos irmãos Jacob (1785-1863) e Wilhelm Grimm (1786-1859) e publicado entre os anos de 1817 e 1822, no volume com várias outras fábulas a que deram o nome de “Kinder-und Hausmärchen” (“Contos de Fada para Crianças e Adultos”, ou contos infantis e domésticos, em tradução literal), além de mencionar “A Menina dos Fósforos” (1848), do dinamarquês Hans Christian Andersen (1805-1875), numa das passagens mais tristes.

“A Academia do Sr. Kleks” acaba sendo uma espécie de profissão de fé no poder da imaginação, e, o principal, no poder da imaginação de uma criança excluída. Em geral, elas têm tornado o mundo um lugarzinho um pouco menos árido.


Filme: A Academia do Sr. Kleks
Direção: Maciej Kawulski
Ano: 2024
Gêneros: Fantasia/Coming-of-age
Nota: 8/10