Suspense francês, na Netflix, vai bugar seu cérebro Divulgação / Netflix

Suspense francês, na Netflix, vai bugar seu cérebro

Famílias, por sua natureza intrínseca, frequentemente recorrem a métodos variados e, por vezes, inusitados para manter a coesão entre seus membros. Composta por indivíduos com gostos, manias, traumas e paranoias próprios, a dinâmica familiar é uma verdadeira montanha-russa emocional. Essas emoções intensas frequentemente ultrapassam os limites da razão, projetando-se no presente e influenciando o futuro de maneiras imprevisíveis.

As experiências familiares têm um poder transformador, e suas consequências, sejam positivas ou negativas, raramente se limitam ao momento presente. Elas criam raízes profundas, contaminando o terreno emocional até que a hipocrisia e o vício permeiem tudo, clamando por uma verdade inevitável e transparente.

O tempo, embora capaz de curar feridas, também pode agravar as chagas abertas das relações humanas. A forma como lidamos com nossas questões mais profundas molda os passos futuros rumo à felicidade, um objetivo constantemente sabotado por negligências de diversas ordens. Eventos passados, ocorridos em fases anteriores da vida, ressurgem com força redobrada sempre que uma nova vulnerabilidade nos atinge, abalando nosso espírito. Nessas horas, é crucial encontrar forças em um lugar inexplorado para talvez virar a página e dar uma nova chance à vida, um desafio nem sempre superado com sucesso.

“O Paciente Perdido” é uma obra que ilustra bem essa complexidade das relações humanas. O filme, dirigido pelo francês Christophe Charrier, adapta a graphic novel homônima de Timothé Le Boucher, com roteiro de Charrier e Elodie Namer. A narrativa inicia-se de maneira surpreendentemente iluminada, destoando do tom sombrio que prevalece no restante da trama. Essa abertura logo é contextualizada, inserindo-se em um todo inicialmente confuso, mas que vai se clarificando com o desenrolar da história.

O assassinato central da trama é revelado como uma carnificina perversa, vitimando o pai (Stéphane Rideau), a mãe (Audrey Dana) e o personagem de Matthieu Lucci, que é inicialmente apresentado como primo. Contudo, esse ponto da narrativa esconde segredos que são desvendados gradualmente. Charrier guia a audiência para um ponto de vista mais confortável, onde a história pode ser apreciada em sua plenitude, embora ainda restem algumas pontas a serem amarradas.

O filme se destaca ao delimitar claramente os dois ambientes psicológicos principais onde os eventos cruciais ocorrem. Thomas, interpretado por Txomin Vergez, está frequentemente no hospital, lidando com amnésia e trauma, e participando de sessões de terapia com uma psicoterapeuta vivida por Clotilde Hesme. Paralelamente, Laura, interpretada pela excelente Rebecca Williams, emerge como a peça central da narrativa, justificando os crimes macabros que dizimaram a família de Thomas.

Misturando elementos de Agatha Christie com a intensidade de Edgar Allan Poe, “O Paciente Perdido”, na Netflix, possui méritos próprios. Mesmo que Charrier opte por enquadramentos excessivamente amplos, o filme mantém seu valor como um suspense psicológico denso e intrigante.


Filme: O Paciente Perdido
Direção: Christophe Charrier
Ano: 2022
Gêneros: Drama/Mistério/Suspense
Nota: 8/10