Filme com Glenn Close e Michael Douglas, que lucrou 30 vezes o próprio orçamento e escandalizou o mundo, está na Netflix Divulgação / Paramount Pictures

Filme com Glenn Close e Michael Douglas, que lucrou 30 vezes o próprio orçamento e escandalizou o mundo, está na Netflix

“Atração Fatal” é um filme controverso, e isso não tem nada a ver com suas numerosas cenas de luxúria quase explícita. Muitos dos nós dessa trama desatam-se com sexo, é verdade; contudo sob a fina camada de interesse diante do relacionamento de dois estranhos que avança para uma perseguição doentia da parte à primeira vista mais frágil ao outro lado, que se sentia livre da necessidade de vínculos ou a salvo de cobranças de qualquer natureza, há debates pouco mais que simbólicos a respeito de machismo, mulheres independentes (e um tanto desesperadas por contar com a presença masculina), a máscara da hipocrisia caindo à luz baixa dos encontros fortuitos, a invencível solidão que espreita-nos a todos. 

Adrian Lyne capta essas sutilezas do roteiro de James Dearden e as transforma num caldo de emoções que refervem em fogo baixo, até que os dois grandes personagens da história deixem sua face mais perversa vir à tona, cada qual atacando e defendendo em justa medida, e prenunciando para o espectador mais atento a tragédia íntima que poderia muito bem ter sido evitada.

Dan Gallagher, o advogado vivido por Michael Douglas, está num casamento feliz há nove anos, tem uma filha de seis, Ellen, ama sua esposa, Beth, e tudo parece que vai seguir dessa forma até que um dos dois sucumbe a uma velhice tranquila. Mas havia uma sombra em seu caminho, uma sombra loira e ávida por uma boa conversa, minutos de troca de confidências e, claro, um demorado intercurso sexual, no elevador de seu prédio, na bancada da cozinha e até na cama. 

É o que acontece depois que seu caminho cruza com o de Alex Forrest num evento corporativo entusiasmante como uma partida de bocha. Tudo jamais passaria de uma aventura para Dan, uma vez que desde o início ele fez questão de frisar que era comprometido, e ele tinha certeza de Alex o entenderia. Evidentemente, as coisas vão tomando um rumo inesperado conforme a mulher dá sempre um jeito de estar por onde o amante ocasional circula, vai ao escritório dele, liga de madrugada, atira uma substância corrosiva em seu carro e resolve, afinal, que é hora de fechar o cerco e encontrar-se com a esposa traída, com a desculpa de querer comprar o apartamento que o casal botou à venda. 

A despeito de todas os esforços quanto a manter narrativa equilibrando-se no fio de suspense urdido pelos corpos nus dos protagonistas em contraponto à violência que encarnam depois, essa cena é, sem a menor dúvida, a melhor do longa. Num plano-sequência irretocável perfeito, Lyne põe em cena Anne Archer, Glenn Close e Michael Douglas, que empresta a Dan a fisionomia que mistura pânico e repulsa, até que a ação corta para a mão que é forçado a dar à intrusa. 

Algumas coisas tanto ou mais abjetas ocorrem até o encerramento, para o qual o diretor pensou em duas alternativas — a exemplo do castigo que Alex reserva ao pobre coelhinho de estimação da filha de Dan e Beth, momento em que Ellen Hamilton Latzen arranca umas lágrimas dos mais sensíveis —, umas originais, outras só um pastiche do que se tem em “Quando Se Perde a Ilusão” (1984), de Michael Apted (1941-2021), mas sórdida e nauseante mesmoé a ideia que certas pessoas nutrem acerca de prazer, espelhada ora por Dan, ora pela mulher por quem permitiu-se seduzir. Não fosse a saída artificiosa para separá-los de vez, “Atração Fatal” seria um filme além de controverso, matador.


Filme: Atração Fatal
Direção: Adrian Lyne 
Ano: 1987
Gêneros: Drama/Suspense/Erótico 
Nota: 9/10