Como essência das relações humanas, o amor precisa se transformar para sobreviver ao desgaste do tempo. Kay, a dedicada esposa em “Um Divã para Dois”, luta incansavelmente para manter seu casamento com Arnold, mesmo sentindo que seus esforços são unilaterais e não conseguirão resgatar anos de monotonia e indiferença. É nesse ponto que David Frankel propõe uma solução que ocupa grande parte dos cem minutos do filme, levando Kay e Arnold a uma jornada de redescoberta em um ambiente que jamais conheceriam por conta própria, um lugar arejado onde sentimentos podem ser revitalizados.
Frankel utiliza alguns artifícios para que o público leve a sério o casal interpretado por Meryl Streep e Tommy Lee Jones, dois atores brilhantes, mas inicialmente sem aparente química. O principal truque é equilibrar suas atuações, permitindo que brilhem juntos em cenas que exigem cumplicidade, e posteriormente, liberando-os para expressar as qualidades que justificariam uma união de 32 anos, apesar de nunca terem compartilhado a mesma cama hospitalar.
“Um Divã para Dois” reconhece suas limitações e as aborda com honestidade. Desde o início, a roteirista Vanessa Taylor apresenta Kay se arrumando em uma camisola azul, preparando-se para atravessar o corredor e bater na porta do quarto onde Arnold lê. Taylor revela que Arnold começou a dormir no quarto de hóspedes após sofrer uma lesão nas costas ao pintar o quarto do filho, Brad, interpretado por Ben Rappaport, há mais de duas décadas, e nunca mais voltou ao leito conjugal.
A coluna se recuperou, mas problemas como dispepsia, apneia e ronco mantiveram a separação. Ver Streep em um papel de mulher madura enfrentando problemas conjugais não é novidade — ela já explorou esse terreno em filmes como “Amor à Primeira Vista” (1984), “As Pontes de Madison” (1995), “Simplesmente Complicado” (2009) e até “O Diabo Veste Prada” (2006), cada um abordando um aspecto distinto da questão.
A verdadeira surpresa é Tommy Lee Jones como um machão reticente e cheio de pudores em relação à esposa, transformada em uma figura quase assexuada após três décadas de convivência. Jones, conhecido por seu papel em “Homens de Preto”, subverte estereótipos com sutileza, ao mesmo tempo que os utiliza quando necessário. Isso fica evidente quando ele, persuadido por Kay, concorda em gastar quatro mil dólares em uma espécie de reabilitação conjugal, conduzindo a trama para um tom tragicômico essencial para o enredo.
Em Hope Springs, uma pequena cidade no Maine, Kay e Arnold encontram o doutor Feld, um terapeuta de casais interpretado por Steve Carell, e o filme começa a brilhar. Carell, como Jones, impressiona ao personificar a sensatez que falta ao casal, embora os protagonistas mantenham o controle da narrativa. A segurança de Frankel ao guiar seus atores através de situações patéticas e arriscadas, como uma tentativa desajeitada de Kay em recuperar o tempo perdido em um cinema, define o tom até o desfecho, onde uma bela sequência confirma a sincera reconciliação do casal. O casamento pode ser uma loteria, mas uma vez feita a aposta, é preciso torcer pelo grande prêmio.
Filme: Um Divã para Dois
Direção: David Frankel
Ano: 2012
Gêneros: Drama/Romance
Nota: 8/10