Ao incluir Richard Williams no título de seu filme, Reinaldo Marcus Green transmite uma mensagem clara. “King Richard: Criando Campeãs”, no Prime Video, fala muito mais do personagem antes do aposto do que da dupla de irmãs vencedoras de Wimbledom e do Grand Slam, muito tempo depois e ao cabo de muita luta, muito sacrifício e muitas derrotas.
Richard saiu de sua Cedar Grove natal, na Louisiana, sudeste americano, para se radicar na ensolarada (e muito mais auspiciosa) Compton, ao sul de Los Angeles, à procura de condições mais dignas, mas também para escapar do cerco da Klu Klux Klan, uma facção que se notabilizou por difundir ódio racial nos Estados Unidos, na ativa até hoje.
O roteiro de Zach Baylin até tenta colocar em prática alguma metodologia e dividir os excessivos 145 minutos do longa entre pai e Venus e Serena, as filhas, criadas por ele e a esposa, Oracene, a Brandi, mãe das garotas, e de Isha, Lyndrea e Yetunde, quatro figuras que surgem bissextamente no decorrer da trama, e vão se apagando à medida que o diretor volta os holofotes para as tenistas, deixando sua história autorreferente, concêntrica e monótona, apesar do desejo óbvio e louvável de inspirar admiradores do esporte e das biografadas. Nisso, Green liquida um set atrás do outro.
A composição de Will Smith para Richard Williams resvala num experimentalismo um tanto forçado, de que só se salva nos momentos em que o enredo se volta para Venus e Serena, desde sempre envolvidas com o tênis por influência — ou seria a mando? — do pai. De maneira involuntária ou proposital, o diretor ressalta o temperamento obsessivo de Richard, convicto de que seus rebentos serão grandes revelações do esporte mundial, mesmo que tudo deponha em contrário.
Por mais que seus esforços venham a frutificar — à custa de privações, ultrajes e batalhas que sabia vãs, reitere-se —, Richard mostra um lado psicótico no qual Green não se aprofunda, por evidente, deixando para o julgamento para quem assiste. Numa das melhores cenas, o patriarca defende a honra de Tunde, leva uma surra e volta para casa, fazendo questão de que suas mulheres vissem-no naquele estado. Aqui, o diretor consegue ainda juntar o argumento racialista, como faz Denzel Washington em “Fences – Um Limite Entre Nós” (2018), numa escolha arriscada, mas certeira.
Demi Singleton como Serena e Saniyya Sidney na pele de Venus capturam todas as atenções nas sequências em que as meninas se preparam para um pequeno campeonato, e daí para Wimbledom, parece fácil, mas a enfermeira Brandi, alijada do processo sem que note, enxerga melhor as pedras desse calvário. Aunjanue Ellis absorve as inquietações e os dilemas entre o realismo que pode matar de uma vez por todas o sonho das filhas e a necessidade de se perseverar, que se materializa, afinal.
Nove meses mais tarde, Venus, aos quinze anos, assinou um contrato de doze milhões de dólares com a Reebok, e Serena juntou-se à irmã dois anos depois. Às vésperas de completar 44 anos, Venus foi a vencedora de Wimbledom por cinco vezes e a primeira mulher afro-americana na era dos abertos a chegar ao topo do ranking. Aos 42, Serena venceu o Grand Slam em 23 ocasiões, o que faz dela a maior atleta do tênis da História do esporte para muitos especialistas. Como Richard, esse adorável maníaco, sempre soube.
Filme: King Richard: Criando Campeãs
Direção: Reinaldo Marcus Green
Ano: 2021
Gêneros: Drama/Biografia
Nota: 8/10