Deliciosamente divertido, filme com Sandra Bullock na Netflix vai fazer você esquecer todos os problemas Divulgação / Paramount Pictures

Deliciosamente divertido, filme com Sandra Bullock na Netflix vai fazer você esquecer todos os problemas

Misturar romance e aventura pode render histórias que não são nem de amor e muito menos têm ritmo frenético o bastante para serem consideradas à luz de um conto sobre aqueles que enfrentam o destino sem medo. Balançando entre um e outro galho, “Cidade Perdida”, o épico sentimental de Aaron e Adam Nee, não tem a menor urgência quanto a decidir-se por este ou aquele rótulo. Os irmãos usam uma estratégia certeira para atingir o coração do público: ter por norte o desempenho de seus atores principais. É por aí que saciam a curiosidade a respeito das angústias de uma mulher e um homem num momento cheio de adversidades insólitas — sem deixar na mão quem prefere manter-se a distância, tentando adivinhar até onde vai essa loucura. O roteiro dos Nee e outros três colaboradores destaca a força do casal de protagonistas, intérpretes hábeis, cada um a seu modo, contraponto inequívoco para um filme estranho, mas saboroso.

Na primeira cena, o espectador vislumbra o caos indiscriminado que há de ser a tônica pelos próximos 112 minutos. Loretta Sage, uma escritora de literatura de aeroporto para mulheres solitárias, é vista se atracando com um homem alguns anos mais novo em meio a serpentes enquanto alguém com um chicote e sob a proteção de capangas, os observa de cima. A sugestão erótica do quadro não é apressada, tampouco gratuita — os diretores agarram-se a uma pletora de outras inferências como essa, conforme se vai assistir do segundo ato em diante —, e não é preciso ser nenhum gênio para se prever o rumo que essa prosa vai tomar. Enquanto isso, Loretta olha ao seu redor e tudo parece-lhe falso, as cobras parecem excessivamente adestradas, uma vez que não atacam, e ninguém tem certeza de como a dupla foi parar ali, caída sabe-se lá de que azul.

O certo a fazer é jogar aquilo fora e reordenar os palpites para o último tomo de seu novo romance, empreitada sem fim a depender da justa palavra, de um gancho crível, de uma ideia que preste. Alan, o bonitão com doutorado em matemática aramaica responsável por salvar a mocinha de imbróglios dessa natureza, tem de ficar, claro, mas também ele está precisando mostrar serviço. Os Nee tiram excelente proveito das situações em que seus personagens centrais se metem feito se tivessem vida própria e a partir de então, “Cidade Perdida” deixa-se arrastar para o olho de uma espiral de subtramas a princípio desvairadas, mas que vão se justificando organicamente.

Com alguns estereótipos, mas de forma genuína, intrépida, Sandra Bullock personifica a mulher de meia idade que se tortura com questionamentos a suas próprias conquistas, das quais só pôde desfrutar renunciando a uma vida conjugal duradoura e mesmo a boas horas de idílio e sexo aos sábados à noite. Channing Tatum, por seu turno, surpreende no papel do falso troglodita, musculoso, porém sensível, a encarnação das fantasias de Loretta, que também urde sonhos quanto à imagem da heroína de seus relatos, materializada, como não seria de outro jeito, sempre sob a sua estampa. A graça maior do filme está nessa desafetada brincadeira metalinguística, enriquecida por um elenco de apoio dotado de comediantes habilidosos. E mesmo o antagonista de Daniel Radcliffe, meio canastrão, convence.


Filme: Cidade Perdida
Direção: Aaron e Adam Nee
Ano: 2022
Gêneros: Aventura/Ação/Romance 
Nota: 8/10