As grandes decisões na vida de uma pessoa frequentemente se escondem, surgindo de maneira inesperada em caminhos sinuosos, sem qualquer aviso prévio, prontos para transformar a realidade de forma surpreendente. Esse processo é inerentemente caótico, sem regras que possam conferir-lhe ordem, e cada indivíduo o absorve da maneira que lhe é possível, evidenciando que viver escapa a qualquer previsão.
A única certeza universal é que a vida é composta por sonhos, muitos dos quais são considerados extravagantes e absurdos, mas perseguidos incessantemente pelo ser humano, ansioso por satisfazer uma fome espiritual que existe desde os primórdios. Esse desejo por algo intangível e invisível serve, paradoxalmente, como o critério para determinar se vale a pena continuar buscando a beleza da vida, que é rara e cuidadosamente oculta. Este é o único modelo a ser seguido para diferenciar entre viver e simplesmente existir no mundo.
Todos almejamos uma vida normal, e, ao alcançá-la, deparamos com diversos desafios inesperados e improváveis, que nos levam a questionar se estamos sendo punidos por faltas passadas que mal lembramos. Ficamos inconformados com a interrupção abrupta de nossa felicidade arduamente conquistada, que parece nos escapar como areia entre os dedos. A vida começa a desmoronar, e, quanto mais tentamos reagir, mais frágil se torna a situação.
Em seu segundo longa-metragem, o diretor espanhol Gonzalo Bendala aborda complexas discussões filosóficas a partir de um acontecimento trágico que envolve todos os personagens. “Quando os Anjos Dormem” explora a reação de um homem comum a um evento que altera radicalmente sua vida, provocando um debate profundo sobre temas como moralidade, livre-arbítrio e psicopatia, além de questões sociais, especialmente no que diz respeito às autoridades policiais.
Criando uma narrativa que se desdobra muito além do esperado após uma análise superficial — como já fizera em “Innocent Killers” (2015), seu primeiro longa — Bendala apresenta a história de Germán, um pai de família amoroso e marido devotado interpretado por Julián Villagrán. O roteiro foca intensamente neste personagem, embora outros também tenham papéis significativos e contribuam para elevar a qualidade do enredo. O grande mérito do filme é convencer o espectador de que Germán é um herói típico, com poucas nuances de personalidade ou temperamento.
Quando seu carro é abalroado ao sair do trabalho para o aniversário da filha, Estela, interpretada por Sira Alonso, ele reage de forma contida, sem sequer soltar um palavrão. A compostura deliberada do personagem é capturada por Villagrán, que usa essa característica para superar o grande obstáculo que ameaça sua vida pacífica. Ficamos com raiva de Germán, mas temos que admitir: ele é um homem capaz de enganar até o próprio diabo. Portanto, ele merece o que lhe vem.
Filme: Quando os Anjos Dormem
Direção: Gonzalo Bendala
Ano: 2018
Gênero: Suspense
Nota: 8/10