O filme de ação da Netflix que Tarantino considera a melhor atuação de Jessica Chastain Divulgação / GEM Entertainment

O filme de ação da Netflix que Tarantino considera a melhor atuação de Jessica Chastain

A vida é um bem inestimável, mas quando transformada em mercadoria, com preço e validade, revela-se uma falha no progresso da civilização. A ineficiência do Estado em administrar suas responsabilidades resulta na legitimação tácita do abuso por parte de certos indivíduos, que se sentem autorizados a resolver situações complexas de forma extrema e final.

A decisão de vida ou morte torna-se um capricho, delegada a indivíduos especialmente posicionados para eliminar, de maneira pragmática, qualquer pessoa incômoda. Se essa aberração fosse normalizada, logo haveria grandes empresas especializadas em eliminar “imundícies” — um termo eufemístico para se referir a criminosos — promovendo uma segurança artificial e perigosa, sempre à mercê de criminosos mais audaciosos, que enfrentariam a situação com redobrada intensidade.

O combate ao crime com métodos criminosos é obviamente inviável. Apesar das crescentes dificuldades cotidianas, é essencial buscar soluções equilibradas, uma noção que, embora evidente, não é universalmente aceita. Muitos veem no caos uma oportunidade para benefício próprio, acumulando riqueza às custas da desordem, na esperança de um futuro onde a violência não seja necessária para manter sua posição.

A protagonista de “Ava” (2020) parece confortável em sua ilegalidade, mas isso é apenas aparente. O diretor Tate Taylor insere em sua personagem principal ações e pensamentos provocativos, desafiando as normas sociais sem receio de represálias. Ava, uma mulher elegante, é conhecida no submundo pelo peculiar hábito de oferecer às suas vítimas uma morte digna, o que a diverte. Sua psicopatia pode parecer excentricidade, mas ela mesma reconhece sua anormalidade, um ponto que entretém o público.

No roteiro de Matthew Newton, Jessica Chastain interpreta Ava, uma figura oposta a Maya de “A Hora Mais Escura” (2012), dirigido por Kathryn Bigelow, que narra a caça a Osama Bin Laden. Ava se assemelha mais à personagem perturbada de “Os Olhos de Tammy Faye” (2021), ambas lidando com os fantasmas de vidas desordenadas.

No início do filme, Ava, uma alcoólatra em recuperação e ex-delinquente juvenil, encontra um homem no aeroporto de Paris, trajando-se de forma impecável, com batom roxo, pele alva e peruca loira. Após uma conversa sexualizada com Peter, interpretado por Ioan Gruffudd, ela o conduz a um local isolado, onde o surpreende de maneira nada romântica, demonstrando sua eficiência em concluir missões sem consideração por sensibilidades.

As fraquezas de Ava se revelam na relação tumultuada com sua mãe, Bobbi (Geena Davis), e a irmã, Judy (Jess Weixler), agora casada com Michael, um antigo interesse de Ava, interpretado pelo rapper Common. No outro extremo, há Duke (John Malkovich), o mentor que a elevou ao status de assassina de aluguel altamente requisitada por corporações globais. No entanto, sua carreira instável é ameaçada por Simon (Colin Farrell), provável sucessor de Duke, que a vê como um alvo fácil, expondo suas falhas e zombando de seus vícios.

Ao explorar os segredos e dilemas de Ava, Taylor cria um dos thrillers mais intensos do cinema recente, aproveitando a forte parceria entre Chastain e Davis, que poderia ter sido ainda mais aprofundada em certos momentos. Ava deseja mudar, reconciliar-se com sua mãe e refazer sua vida, mas é evidente o quanto está presa àquilo que pensava ser perfeito. O tempo da esperança passou, e ela apenas finge não se importar.


Filme: Ava
Direção: Tate Taylor
Ano: 2020
Gêneros: Thriller/Drama/Crime/Ação
Nota: 9/10