Filme com Matt Damon na Netflix, o mais caro já filmado inteiramente na China, é um espetáculo selvagem Jasin Boland / Universal Pictures

Filme com Matt Damon na Netflix, o mais caro já filmado inteiramente na China, é um espetáculo selvagem

Desejos exigem condições muito específicas para se materializarem e se tornarem reais. A chegada ao poder não ocorre por acaso; é uma conquista que demanda habilidades peculiares, independentemente das verdadeiras intenções dos aspirantes ao controle global. Estes indivíduos, homens e agora também mulheres, estão dispostos a sacrifícios, pactos que desconsideram a moral e a ética públicas, acordos com antigos adversários e até mesmo transformações físicas para alcançar o auge. Fascinado pelo aroma enebriante da pólvora e pelo estrondo dos canhões, que explodem em intervalos cada vez menores, o ser humano fez da guerra um meio para superar várias limitações, especialmente as intelectuais.

O cineasta chinês Zhang Yimou baseia-se em lendas sobre um dos inventos mais controversos da história para criar “A Grande Muralha” (2016), um filme planejado para encantar o público que aprecia narrativas fantásticas, mas que também suscita discussões interessantes. O roteiro, coescrito por Max Brooks e mais cinco autores, assume a forma de um épico em que o foco não está tanto no adversário, mas em quem empunha a espada. Entender essa sutileza permite alcançar conclusões mais complexas.

Yimou centraliza a narrativa em dois mercenários brancos que se envolvem em um enigma após destruírem uma criatura que parece perdida entre o Período Jurássico e o século XV, época em que a história se desenrola. Há outras centenas de milhares de monstros semelhantes abaixo do solo, prontos para atacar a Grande Muralha da China a cada sessenta anos, demonstrando sua superioridade física e habilidades bélicas. Capturados pela Ordem Sem Nome, uma legião de guerreiros dedicados a proteger as tradições chinesas, William Garin e Tovar, interpretados por Matt Damon e Pedro Pascal, não se intimidam com as ameaças e pretendem roubar pólvora para vendê-la na Europa.

A fotografia de Stuart Dryburgh e Xiaoding Zhao, com seu predomínio de tons frios e sombrios, e as criaturas subterrâneas criadas por Andrew Baker, destacam-se visualmente, mostrando o esforço de Yimou em criar uma história envolvente. No entanto, o filme tropeça no aspecto sociológico. O personagem de Damon é rapidamente imbuído de uma aura messiânica que empobrece a trama, tentando convencer a audiência da importância vital de William, mais aventureiro que herói, na luta contra os Tei Taos, os dinossauros fora de época que assolam a China medieval. A ideia do salvador branco é antiga e eficaz, e nem a evolução do personagem de Jing Tian alivia o desconforto.

Apesar de demonstrar bravura, a general Lin Mae não consegue transmitir a ideia de uma mulher asiática disposta a morrer por sua terra, ficando à sombra do mercenário americano, que a humilha ao sugerir que há motivos mais nobres para lutar além de dinheiro e comida. O contraste entre os temperamentos dos personagens não é suficiente para evitar a insinuação de um romance, que não se concretiza, deixando uma sensação de desconforto no espectador.

Como uma coprodução sino-americana, o trabalho de Yimou é um compêndio de clichês, mitigado em certa medida pelo uso eficaz de computação gráfica e cenas de batalha. As repetições que sobram não merecem atenção.


Filme: A Grande Muralha
Direção: Zhang Yimou
Ano: 2016
Gêneros: Ação/Fantasia
Nota: 7/10