Quando me atrevi a escrever sobre Ary Barroso, me veio à memória a história dele com Walt Disney, durante sua estada no Brasil em 1941, como parte da política da boa vizinhança implementada por Roosevelt durante a Segunda Grande Guerra e que aproximou definitivamente o Brasil dos Estados Unidos.
Acontece que a criatividade de Disney assombrava a todos e, aqui, ele criou o personagem Zé Carioca, que foi apresentado ao mundo e se tornou o principal personagem brasileiro da Disney, que recebe, durante o transcorrer da película “Alô Amigos”, o personagem Pato Donald para um passeio pelo país e pela América Latina. Em 1944 e 1948, Zé Carioca apareceria em mais dois longas-metragens, respectivamente, “Você já foi à Bahia?” e “Tempo de Melodia”, entretanto a consolidação do personagem se deu pelas histórias em quadrinhos.
Durante sua visita quase diplomática ao Brasil, Disney ficou impressionado, à época, com o samba, as paisagens e a riqueza cultural do Brasil. Desde então, os produtores que o acompanhavam se encantaram com os papagaios, até então desconhecidos por eles. Foram, então, visitar o zoológico e museus para conhecer de perto a ave, o que resultou na criação do personagem.
Várias teorias foram criadas para contar a origem do personagem, mas a mais aceita é a de que Disney ficou impressionado com a convivência plural que por aqui encontrou. Com isso, ao se instalar no Copacabana Palace, improvisou em um salão do hotel uma mini filial dos estúdios Disney.
A teoria mais aceita é que o papagaio teve origem no músico José Patrocínio Oliveira, pois Disney, ao conhecê-lo, viu ratificada a presença do jeito do malandro carioca do personagem, personificada no músico que já tocava com Carmem Miranda nos EUA. E, José do Patrocínio, o Zezinho, era paulista nascido em Jundiaí. Cavaquinista, ele foi a voz do papagaio nos dois primeiros filmes, e depois fez carreira no exterior.
Tal qual o personagem, Zezinho usava chapéu-palheta. O paletó, a gravata borboleta e o guarda-chuva sempre debaixo do braço foram inspirados em outra figura antológica do Rio, que andava para todo lado carregando a peça dessa maneira, dr. Jacarandá, muito conhecido por sua “lábia”. As roupas usadas por Zé Carioca foram inspiradas nos malandros e sambistas cariocas das décadas de 1930 e 40.
Com Zé Carioca desenhado a caráter, como um real malandro carioca, ele também morava no Rio de Janeiro, dançava samba e esbanjava charme. Contudo, como representante do governo americano aqui no Brasil e patriota como a grande maioria dos americanos, Disney, ao desenhá-lo, não se esqueceu de suas origens, deixando um traço muito bem-visto na terra de Tio Sam, as cores da bandeira dos EUA, as quais deram o tom ao rabo do papagaio.
Com isso, traduz-se que o papagaio homenageia o Brasil com suas cores, sem, todavia, estar marcado por indelével laço com os americanos. Em agosto deste ano, o papagaio completará 83 anos de idade, sem carrear consigo toda aquela malandragem estelionatária com a qual veio ao mundo, mesmo porque, os traços de hoje são bem mais brasileiros do que outrora, será?