Amat Escalante, cineasta de origem espanhola estabelecido em Guanajuato, México, destaca-se por abordar as deficiências e aspirações da sociedade mexicana contemporânea. Passados dez anos da estreia de “Heli” (2013), que narra a história de amor interrompida de um jovem de dezessete anos e uma garota de treze em meio ao tráfico de drogas, Escalante retorna ao foco da crítica cinematográfica.
Seu mais recente trabalho, “Perdidos en la Noche”, explora temas similares aos de “Heli”, retratando um filho que busca a mãe desaparecida por três anos até encontrar uma pista crucial. Este enredo serve de base para Escalante examinar criticamente a presença avassaladora do narcotráfico, o trabalho em condições análogas à escravidão, e a concentração de riqueza nas mãos de poucos. O filme também aborda a dependência americana de petróleo, conforme apontado por George W. Bush, e o papel das milícias nessa complexa teia social e política.
Neste longa-metragem, Escalante colabora novamente com seu irmão Martín, parceiro em “Os Bastardos” (2008), e com Paulina Mendoza, para criar um retrato impactante da exploração e miséria de certas camadas da população mexicana. A trama se inicia com uma assembleia em uma pequena cidade próxima à fronteira dos Estados Unidos, onde os moradores debatem a presença de uma mineradora já estabelecida.
Paloma, uma professora engajada em causas sociais, expressa sua oposição à empresa mineradora, enfrentando a resistência e hostilidade dos outros moradores, que chegam a arremessar frutas podres nela. A participação breve, mas marcante, de Vicky Araico define o tom dramático que se desdobra em críticas sociais abrangentes no decorrer do filme.
O intervalo de três anos entre o desaparecimento de Paloma e a descoberta de um possível responsável pelo crime é apresentado com uma dose de licença poética. O design de produção de Daniela Schneider não sugere mudanças perceptíveis nesse período. A narrativa avança quando Emiliano, filho de Paloma, conhece Josito após um acidente de trabalho que quase deixa um colega paraplégico. Josito, sobrevivente de uma tentativa de assassinato, indica a Emiliano onde procurar respostas sobre o desaparecimento de sua mãe.
Emiliano chega à casa dos Aldama Duplas, uma família de artistas composta pelo escultor Rigoberto Duplas, sua esposa Carmen, uma atriz e cantora famosa, a enteada Mónica e a filha mais nova do casal. Essa família excêntrica e emocionalmente instável é o ponto de convergência para os eventos centrais do enredo. Enquanto isso, Fernando Bonilla e Bárbara Mori capturam a atenção do público como um casal neurótico, temeroso das ameaças de uma comunidade fictícia que adora a divindade maia Alux, a quem atribuem caos e destruição.
A cena de dois pitbulls envenenados, resultado de uma suposta vingança dos Aluxes contra Rigoberto, que acusou seus vizinhos de crimes hediondos, começa a revelar as conexões entre a família Aldama e a mineradora, além de esclarecer o desaparecimento de Paloma. Escalante insere elementos que aumentam o estranhamento e o mistério, embora não contribuam diretamente para o avanço da trama.
As interações perturbadoras entre Emiliano e Mónica destacam as atuações de Ester Expósito e Juan Daniel García Treviño. Treviño, mais confiante desde “Ya No Estoy Aquí” (2019), conduz o ritmo do filme com uma performance que mistura o temperamento autodestrutivo de Emiliano com sua busca incansável por justiça, mantendo-se firme em meio à escuridão e tormento de seus dias.
Filme: Perdidos en la Noche
Direção: Amat Escalante
Ano: 2023
Gêneros: Thriller/Mistério
Nota: 9/10