Adaptado de obra-prima literária, filme com Anthony Hopkins e Nicole Kidman está no Prime Video Divulgação / Miramax

Adaptado de obra-prima literária, filme com Anthony Hopkins e Nicole Kidman está no Prime Video

“The Human Stain” é um daqueles filmes que não são fáceis de comentar. Uma história complexa e inteligente, definitivamente não foi fácil adaptá-la para as telas. Baseado no romance de Philip Roth, o filme de Robert Benton convence graças ao elenco extraordinário, que torna inquestionável qualquer fato sugerido pela história.

Anthony Hopkins é Coleman Silk, um professor universitário de meia-idade que se tornou reitor de uma universidade falida e conseguiu reerguê-la. No entanto, depois de um incidente na sala de aula, ele é acusado de racismo e, ao invés de se defender das acusações, decide se afastar do cargo. Sentindo-se solitário e isolado sem a vida acadêmica, ele se envolve com Faunia Farley (Nicole Kidman), uma faxineira da universidade com metade de sua idade.

Ambos possuem segredos nebulosos em seus passados. A relação entre eles é sexual e quase sempre confessional. Unidos pelas dores não pronunciadas, o romance toma contornos conturbados depois que o ex-marido de Faunia, Less (Ed Harris), volta a perseguí-la. Um homem violento que se nega a aceitar o fim da relação, Less é um ex-combatente do Vietnã que parece preso em um delírio da guerra.

Quando ele reaparece de maneira ameaçadora na casa de Faunia e tem um confronto com Silk, ele denuncia um segredo doloroso: o casal tinha dois filhos que morreram em um incêndio provocado por um acidente com o aquecedor. Faunia, que nunca revelou nada sobre seu passado para Silk, se vê obrigada a retirar de debaixo de sua cama seus dois únicos objetos pessoais que dão pistas sobre quem ela é: duas urnas contendo as cinzas dos filhos.

Flashbacks revelam fatos da vida de Silk também e esclarecem os motivos pelos quais as acusações de racismo na faculdade o afetaram tanto pessoalmente. Conhecido como um homem judeu, Silk, na realidade, é de uma família afro-americana, que devido à tonalidade clara de sua pele, decidiu assumir outra identidade, rejeitando sua família e sua negritude.

Ao fingir ser branco, Silk se alistou à marinha e recomeçou sua vida como estudante universitário e depois como um intelectual respeitado. A falsa identidade deu a ele a oportunidade de escalar socialmente com menos dificuldades do que teria se tivesse se assumido afro-americano.

Mas a situação nos Estados Unidos não é única e nem nova. Há pelo menos quatro séculos, há registros da chamada “passagem racial”, em que uma pessoa negra, parda ou multirracial passa despercebida e consegue escapar da segregação e discriminação racial. Na era Antebellum South, em que a escravidão era predominante no século 19, muitos afrodescendentes se passavam por brancos para escapar da escravidão. Filmes como “Identidade” e “O Homem do Jazz” descrevem esse tipo de situação.

É claro que o filme de Robert Benton tem escolhas questionáveis. Uma delas, é óbvio, é a escolha de Anthony Hopkins como um afro-americano. Mesmo assim, ele consegue interpretar seu personagem de forma tão potente e avassaladora que esquecemos os desajustes. Na juventude, Silk é interpretado por Wentworth Miller, que sim, é realmente um afrodescendente de pele clara.

Nos flashbacks, ele relembra o romance com a doce Steena Paulson (Jacinda Barrett), com quem tinha intenções de se casar, mas que fugiu rapidamente depois de ser convidada para jantar com a família de Silk e descobrir que sua família é negra. A partir disso, ele decide não apresentar mais suas namoradas à família e a rejeitar suas raízes.

Um filme que nos desafia a fazer reflexões duras demais e até contraditórias, “The Human Stain”, no Prime Video, vale a ponderação sobre o tema.


Filme: The Human Stain
Direção: Robert Benton
Ano: 2003
Gênero: Drama/Romance/Suspense
Nota: 8/10

Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.