Que atire a primeira pedra quem não quer amar. O problema é que o amor está longe da vista, tão distante que parece estar em outro continente. Eu corro atrás dele, descalça, até que começo a desistir de percorrer o caminho. Me canso. Entro naquela fase em que abro mão de ser feliz se tiver sossego. Sento na calçada, peço um tempo, um gole d’água, estico as pernas. Chego à conclusão de que o amor é vizinho dos outros e estrangeiro de mim. Alguém me faz uma oferta. E eu troco a minha felicidade a dois por um pouco de paz. Negócio fechado.
Não é papo de gente pessimista. É outra coisa. Depois de incontáveis sessões terapêuticas de mesa de bar, cheguei à conclusão de que o meu maior problema sou eu. Isso mesmo. Eu me autossaboto o tempo inteiro. Tamanha é a minha capacidade de prever o futuro que até pensei que eu poderia ter dons mediúnicos. Só que não.
Primeiro comecei a pressentir que o relacionamento não ia dar certo por conta da distância. Mais adiante, previ que estava entrando numa furada porque a primeira letra do nome dele era a mesma do nome do ex. Broxei quando o rapaz da academia disse que não gostava de ler, e nem aceitei tomar a proteína com ele logo após o treino. Enquanto xavecava com um executivo, percebi que o seu celular não parava de tocar. Ele logo tratou de pôr o aparelho em “modo avião”. Pensei: é casado. Fui ao banheiro e nunca mais voltei.
Minhas amigas dizem que eu não me dou a chance de ser feliz, ou de pelo menos tentar ser feliz. Capaz que elas tenham razão. Cheguei até a pensar que pode ser a idade. É que passei da fase de entrar em qualquer embarcação para ver aonde vai dar. E outra: minha companhia é tão agradável que não me faz querer ter qualquer pessoa ao meu lado, alguém que faça figuração ou que tape um buraco. Eu admito que desisto muito rápido e que algumas vezes nem começo a me relacionar. Talvez seja por medo de dar errado, de sofrer e de terminar. Por isso eu fico só com a parte boa — e rasa: o encantamento, a paixão, a novidade. Antes de surgir qualquer possibilidade de vínculo, eu já pulei pela janela.
Então, vou trocando a felicidade incerta pelo sossego, a chance de ter o coração partido pela integridade do meu coraçãozinho. Sim, eu me autossaboto, eu sei. O que eu não sei é se, na verdade, estou me protegendo dos maus ou me escondendo dos bons. Afinal, viver não deveria ser “living la vida loca”? É o que todo mundo fala. Mas, como a minha mãe diz, eu não sou todo mundo.
De que adianta “beijar na boca e ser feliz” quando não se é feliz beijando por beijar? Num mundo onde todos se jogam, eu só observo. Depois deste texto, eu tenho duas certezas absolutas: 1) Eu me autossaboto e 2) Mamãe estava certa. Eu não sou todo mundo.