Thriller psicológico com Florence Pugh é o filme mais subestimado do Prime Video Divulgação / New Line Cinema

Thriller psicológico com Florence Pugh é o filme mais subestimado do Prime Video

Vira e mexe, a era de ouro de Hollywood renasce em filmes glamorosos, em que mulheres eram retratadas como criaturas submissas, lindas em sua meiguice de vestidos de seda estampados, cabelos amarrados em coques no alto da cabeça e estojo de maquiagem sempre a postos, matando o tempo em faxinas minuciosas, preparando assados suculentos ou atualizando o repertório de fofocas no salão de beleza onde encontravam as vizinhas com o mesmo cotidiano.

Olivia Wilde resgata essa aura de felicidade enganosa em vidas bestas e cômodas e “Não Se Preocupe, Querida”, à apreciação ligeira, soa como mais um tributo àqueles dias verdadeiramente gloriosos do cinema. Em pouco menos de quinze minutos, no entanto, o público fica certo das louváveis intenções grandiloquentes de Wilde, em sua segunda experiência por trás das câmeras, quanto a sacudir a poeira do estabelecido e abusar de figurinos e cenários deslumbrantes apontar as fragilidades de uma visão de mundo obsoleta, adicionando à mistura elementos do suspense clássico com tal habilidade que desconfia-se que alguma coisa entre seus personagens, lindos e estranhos, esteja fora do aceitável, mas nunca se sabe o quê. 

Os roteiristas Carey e Shane Van Dyke e Katie Silberman entregam-lhe um texto cheio de nuanças, de que a diretora, como também fizera em “Fora de Série” (2019), seu primeiro filme, tira cenas de irretocável harmonia estética e perturbadoras em suas revelações quase espantosas.

Muito do encanto de “Não Se Preocupe, Querida” deve-se a Florence Pugh. Alice, sua personagem, é a típica dona de casa dos anos 1950. Ela espera pelo marido, Jack — sobre quem paira o mistério que perpassa as duas horas de projeção —, arrumada com esmero, como fazem todas as outras mulheres da vizinhança em Shangri-la, nas imediações de Los Angeles, disfarçando a frustração de um casamento sem filhos, sozinhas juntos aos móveis minimalistas e eletrodomésticos de design então novidadeiro, um achado da direção de arte de Erika Toth.

Todos as manhãs, os maridos saem para trabalhar juntos, à mesma hora, cada um dirigindo seu automóvel vistoso; eles partem para as instalações de um tal Projeto Vitória, acerca do qual a diretora guarda os detalhes mais excêntricos até a undécima hora. Nesse ínterim, o que causa espécie é o número de gente bonita por frame, espelhando justamente o propósito de Wilde de remeter à fase mais romântica dos Estados Unidos.

Um jantar na casa de Frank, fundador da cidade e mandachuva do Vitória, deixa isso claro, além de fornecer a quem assiste indícios, falsos e verdadeiros, sobre o que fazem aqueles homens num terreno isolado a algumas milhas de distância do Shangri-la. Chris Pine incorpora um vilão escorregadio e charmoso, que nunca renuncia a apetites obscuros, o que se fica provado na sequência em que Alice e Jack agarram-se debaixo de seu teto, durante o almoço que Frank e a esposa, Shelley, de Gemma Chan, oferecem para os funcionários do Vitória, lembrando um pouco o mote central de “Longe do Paraíso” (2002), de Todd Haynes.

Se Pugh engrandece o longa, Harry Styles, como ator um ótimo ex-boy band, parece jamais saber direito o que faz ali, dependendo excessivamente das respostas da colega. A presença de Wilde na pele de Bunny também fica com cara de um eterno improviso, como se tivesse entrado de última hora no lugar de uma atriz desistente. Seu trabalho como diretora, todavia, não sofre grande prejuízo por essa razão, e, assim, “Não Se Preocupe, Querida” chega aonde deveria, sem que ninguém tenha de pensar muito no porquê de certas soluções mágicas do enredo.


Filme: Não Se Preocupe, Querida
Direção: Olivia Wilde
Ano: 2022
Gêneros: Thriller/Mistério
Nota: 8/10