Sempre apreciei música clássica como o leigo que sou; neste âmbito, contudo, a consumo há muito tempo e faço-o com um prazer infindável, sempre buscando aprender aquilo que não pude enquanto criança. Elegi como meu compositor favorito o magistral Johann Sebastian Bach e, desde minha adolescência, ouço frequentemente o oratório Paixão Segundo Mateus, que representa o sofrimento e a morte de Cristo segundo o Evangelho de Mateus, com libreto de Picander. Com uma duração de mais de duas horas e meia, é a obra mais extensa do compositor. É também a que mais me emociona.
Não por acaso, há 6 anos, iniciei um caso de amor, nem de todo desinteressado, com a OSESP. Tornei-me sócio, pois, assim estabelecido, poderia descontar minhas contribuições no meu imposto de renda de pessoa física. Contudo, aliado a esse prazer de fugir legalmente do fisco, surgiu também a oportunidade de presenciar boa parte da programação da Sinfônica de São Paulo e, assim, o fiz.
Fortuitamente, minha primeira audição foi justamente com a obra que mais admiro. Foi emocionante sob todos os aspectos, um momento que pude vivenciar com uma maestrina dinamarquesa regendo a orquestra por quase três horas. Jamais esquecerei.
A Sala São Paulo, local onde a orquestra sinfônica homônima se apresenta, é grandiloquente, majestosa e imprudentemente bela. Por lá, fervilha a melhor música em uma arquitetura deslumbrante, acompanhada de uma acústica irrepreensível.
Como sempre me programo para assistir ao que melhor se encaixa em minha agenda (sou médico pediatra), coube-me assistir à pré-abertura da temporada OSESP 2024, com Carmina Burana, uma cantata cênica composta por Carl Orff na primeira metade do século passado. De fato, são 24 poemas musicados, não todos com o mesmo sentimento, sendo uns picantes, outros irreverentes e satíricos e alguns macarrônicos.
Esta composição de Carl Orff tornou-se, em pouco tempo, extremamente popular, principalmente os movimentos de abertura e de fecho, com repercussão estrondosa por ter sido veiculada em filmes e eventos diversos, carregando consigo a pecha de ter sido a peça clássica mais ouvida desde sua primeira gravação.
O regente que estava a dirigir a orquestra é um pequenino amazonense, Hilo Carriel, pianista que já desponta Brasil afora e cuja emoção imprimida em sua condução contagiou todo o público que lotava, mais uma vez, a Sala São Paulo. Este magistral regente teve a perspicácia de conduzir um coral de crianças, além do coral da OSESP, enriquecendo de maneira estupenda a apresentação. Foi uma belíssima apresentação.
Bravo, Hilo! Bravo! Gritava a maioria da plateia ao fim do epílogo de Carmina Burana.
Com isso, meu coração se enche de ânimo ao imaginar que o Brasil tem solução. Segundo Oswald de Andrade, a arte é transformadora e, doravante, desejo que muitos Hilos apareçam para fazer a diferença na mente desses jovens e também nos brindem com seus trabalhos nos diversos cantos das artes…