Dezembro é o mês das listas e da cirrose aguda. Tentando evitar a última, também corro dos pedidos de listas de livros que não lerei e resoluções que jamais cumprirei. Mas… O editor da Bula, Carlos Bonaparte Rommel Willian, move seus exércitos com rapidez; cercado, rendo-me e cometo ainda outra lista das tantas que me ordenaram nos últimos dias. Quais os doze melhores livros que li em 2023, eis o que quer saber o Júlio César das revistas culturais. Complicado, isso: tudo o que li me foi de certo modo proveitoso; tenho dificuldades para estabelecer critérios acerca da diferença entre uma leitura muito boa e outra ótima; a champã de cada confraternização me chama diariamente; o fígado dá sinais de desistência; os aeroportos estão cheios; a conta bancária está vazia… Enfim: sofro com mais esta lista. De qualquer modo, vamos ver o que sairá, já que, sim, li bastante, assisti a séries, paguei tributos e me enfastiei, e isso mais ou menos resume a minha vida desde que deixei os cueiros. Não preciso advertir ninguém de que os doze livros escolhidos poderiam ser outros, se eu não morasse num patropi e não tivesse pregui, preciso? Ah, sim, claro: a ordem é aleatória, por supuesto.
Já começa brutalmente, o Gêngis Khan das letras goianas. Dos doze livros, ainda temos de escolher o campeão, o Ayrton Senna das páginas devoradas neste ano. Como assim, “o melhor”? Só um? Unzinho? Bem, ordem dada, ordem cumprida, ainda que eu a obedeça com dúvidas me rondando. Pois então: há algum tempo programei — e estou cumprindo o que me prometi! — ler a obra completa do raivoso, autorreferente e brilhante austríaco Thomas Bernhard. Assim, o melhor livro de 2023 são dois, conclusão a que cheguei em cismar, sozinho, à noite. “Derrubar Árvores” e “Extinção”, ambos uma crítica contra tudo e todos e ácidos (também engraçados!) panfletos inquisidores sobre a chatice de poses e rituais. Pronto — agora só falta listar mais onze livros, escrevendo comentários curtos, segundo o comando do editor Bernard Montgomery, com no máximo duas (duas!) linhas sobre cada um. Sim, eu sofro; contudo, como mostra de força e independência, me vingarei do Zhukov das listas descrevendo os livros com apenas uma única frase (como naquele campeonato de resumir Proust que o Monty Python promoveu — o vencedor, se não me engano, assim sintetizou os sete volumes de “Em Busca do Tempo Perdido”: “Marcel torna-se escritor”).
A vida é ambígua e sem sentido, o apocalipse nos ronda e a língua húngara é impronunciável.
Papai é intransigente.
Carrère é meu companheiro de armas contra o cão negro.
Um “longo obituário” e uma “floresta de símbolos”, como já se disse sobre esse livro.
Releitura: nossas vidinhas bestas narradas pelo Todo — sim, sim, ele mesmo, o Chefão, o Supremo Arquiteto, Deus.
Deus meu, como são rasos os nossos especialistas de televisão.
Outra releitura do “romance da espera”: “Ali estávamos, de partida e não”.
Le Carré não veio do frio e é um causeur admirável.
Llosa está certo mesmo quando parece estar equivocado.
Sobrevivo — sobrevivo!
Identifiquei-me — e agora tchau, vou ali ficar só.