Uma releitura audaciosa de um dos contos mais antigos e reverenciados da humanidade. A narrativa bíblica de Moisés, que transcende séculos, recebe uma roupagem suntuosa nas mãos de Scott, um cineasta conhecido por sua habilidade em esculpir universos visuais deslumbrantes.
Ao primeiro olhar, “Êxodo” fascina com sua grandeza estética. Cenas de vastas paisagens egípcias e cenas aquáticas que desafiam a imaginação destacam-se, criando um espetáculo visual que prende a respiração. Este é um filme que busca, em cada quadro, revelar a magnitude de uma era onde deuses e homens traçavam seus destinos em linhas paralelas.
Christian Bale, encarnando Moisés, apresenta uma performance camaleônica. Ele navega por um espectro emocional diversificado, desde a introspecção atormentada até a fúria impetuosa de um líder nato. Bale traz uma humanidade tangível a uma figura frequentemente envolta em misticismo. Ao seu lado, Joel Edgerton, como Ramsés, oferece um contraponto intrigante, mesclando a vulnerabilidade de um filho desapontado com a rigidez de um faraó obstinado.
No entanto, é na intersecção entre a grandiosidade visual e a narrativa que “Êxodo” mostra suas fissuras. A escolha de Scott por um realismo quase documental em algumas cenas contrasta estranhamente com os elementos místicos da história. Essa oscilação entre o real e o surreal às vezes desconecta o espectador da jornada emocional dos personagens.
A trilha sonora de Alberto Iglesias, com sua habilidade de tecer emoção através de notas, complementa majestosamente o visual. No entanto, em certos momentos, a música parece carregar um peso emocional que o roteiro, em sua abordagem mais contida, não consegue sustentar sozinho.
Um ponto que não pode ser ignorado é a controvérsia em torno do elenco. Em uma época em que a representação autêntica ganha cada vez mais importância, a decisão de escalar atores predominantemente caucasianos para papéis de figuras históricas do Oriente Médio soou, para muitos, como um descompasso com os avanços contemporâneos no campo da representatividade no cinema.
“Êxodo: Deuses e Reis” é, indubitavelmente, uma experiência cinematográfica que transborda ambição. É uma narrativa que busca o equilíbrio entre a intimidade humana e a escala divina. Embora nem sempre alcance essa harmonia, o filme de Ridley Scott permanece como um testemunho da busca incessante do cinema em reimaginar histórias que formam o cerne de nossa cultura coletiva. Aqui, a história não é apenas contada, mas reinventada com uma ousadia visual que desafia o espectador a ver além do conhecido, navegando por águas que separam o mito da realidade, o divino do mundano.
Filme: Êxodo: Deuses e Reis
Direção: Ridley Scott
Ano: 2014
Gêneros: Aventura/Ação
Nota: 8/10