Filme de ação na Netflix vai te tirar o fôlego e fazer sua cabeça girar Divulgação / Netflix

Filme de ação na Netflix vai te tirar o fôlego e fazer sua cabeça girar

Aos poucos, o Oriente deixa de ser um enigma indecifrável para o resto do mundo, e seu cinema, ainda que com suas muitas idiossincrasias, tem parte fundamental nisso. Masato Harada, por exemplo, um dos diretores mais dinâmicos do Japão, dança conforme a música.

Se “Hell Dogs: A Casa de Bambu” (2022) preserva a aura de fantasia típica dos quadrinhos ao passo que define um andamento manifestamente cinematográfico ao longa, que sobrepõe tramas e reviravoltas sem perder o compasso, tomando a narrativa original — o mangá homônimo assinado por Akio Fukamachi — por base, mas também avançando por outras frentes, “Golpe Perigoso” observa o mesmo padrão, tirando o sumo da narrativa de “Keiso” (2015), o romance de Hiroyuki Kurokawa, sem abrir mão de incluir todas as pirotecnias que consegue, com a diferença de ser este um trabalho muito mais enxuto, cadenciado, no qual contém a saborosa megalomania de seu roteiro em favor da ação, exigindo de seus atores performances excepcionalmente dedicadas. E eles chegam lá sem esforço.

Neri Hashioka leva uma existência precária num bairro humilde de Osaka. Ela já teve conexões sólidas com a Yakuza, a máfia japonesa, mas depois do desentendimento com Goya, o ex-namorado vivido por Yasushi Fuchikami, precisou se contentar em ir para a linha de frente de pequenos trambiques em idosos e suas famílias, o que lhe rende a marcação cerrada das autoridades policiais e temporadas no xadrez, onde estabelece outras conexões.

Na virada do segundo para o terceiro ato, resta inequívoco o poder de Goya, que usa suas bigtecs para lavar dinheiro do crime organizado, e antes disso, Harada explica com mais detalhes o teor da briga entre ele e Neri, episódio que acabou na surdez parcial da moça.

Num desempenho magnético do princípio ao fim, Sakura Ando agarra todas as oportunidades quanto a fazer de sua anti-heroína uma personagem memorável; trocando o gênero do protagonista do livro de Kurokawa, o diretor-roteirista consegue dar ainda mais profundidade dramática ao enredo, realçando a natureza ambivalente de Neri, de uma resistência a toda prova, mas também frágil, à mercê dos homens truculentos de que teve de se aprender a esquivar-se.

Um desses marmanjos bestiais, mas com o qual conserva uma relação amistosa, é Joe, o meio-irmão igualmente criminoso interpretado por RyosukeYamada. O reencontro dos dois conduz o filme a uma pletora de sequências mais aceleradas que violentas, em que Yamada, um excelente complemento à performance meio cartesiana de Ando, libera os monstros da índole perturbada do vilão assumido da história.

As passagens em que Joe, psicopata confesso, enfrenta os adversários de Neri depois de uma infiltração ardilosa num dos cassinos secretos da Yakuza, sediado num galpão supostamente usado para atividades filantrópicas desde 2008, é a porta de entrada para que ele entre no círculo de bajuladores de Goya sem ser notado. 

Todo o restante de “Golpe Perigoso” vibra nesse diapasão, até que o desfecho, sangrento na proporção adequada, acrescenta a dose de loucura numa trama meio calculista. E por isso mesmo genial. 


Filme: Golpe Perigoso
Direção: Masato Harata
Ano: 2023
Gêneros: Policial/Suspense
Nota: 9/10

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.