Comparado com ‘Parasita’, filme inteligente e fora do óbvio está na Netflix

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Ao ser lançado, “O Tigre Branco”, dirigido por Ramin Bahrani, inevitavelmente foi comparado ao aclamado vencedor de quatro estatuetas do Oscar, “Parasita”. Embora ambos mergulhem em questões sociais, explorando as castas na Índia e criticando o sistema opressor, “O Tigre Branco” traz uma abordagem única à tona. Mesmo sem atingir o patamar de refinamento e direção exemplar de “Parasita”, o filme reserva momentos intrigantes que estimulam reflexões profundas sobre democracia, capitalismo e desigualdade.

A obra desafia a noção de que a Índia ostenta o maior e melhor sistema democrático do mundo, expondo desigualdades e argumentando que, na prática, a democracia beneficia apenas os mais privilegiados. Uma frase impactante ecoa, ressaltando que, na Índia, os pobres têm apenas duas vias para alcançar o sucesso: “pelo crime ou pela política”. Essa dura realidade, apesar do sistema de castas, transcende as fronteiras, sendo uma característica universal do capitalismo.

Uma distinção crucial entre “O Tigre Branco” e “Parasita” emerge no gênero; o primeiro flerta com a comédia, incorporando elementos do vibrante cinema bollywoodiano, enquanto mantém uma narrativa impactante. Em contrapartida, o segundo é um drama com nuances sutis de humor ácido.

A despeito da aparente otimismo retratado pelo cenário vibrante e pelas músicas animadas, a trama de “Tigre Branco” desenha uma história permeada por tragédias, expondo as humilhações e dificuldades enfrentadas por um jovem trabalhador na Índia. O protagonista, Balram (interpretado por Adarsh Gourav), sustenta um sorriso forçado, mesmo diante de situações angustiantes, enquanto pacientemente aguarda seu momento de ascensão. Sempre que o diretor quer destacar alguma emoção escondida, ele dá um close-up no rosto de Balram.

A narrativa tece diversas referências ao famoso programa “Quem Quer Ser um Milionário?”, uma vez que Balram, oriundo de uma casta inferior, deixa sua vila em busca de sucesso, almejando tornar-se um milionário. Desde o início, a audiência tem a certeza de que ele atingirá seu objetivo, mas o enigma persiste: de que maneira e a que custo?

A fotografia do filme colabora para destacar as diferenças dos estratos sociais, enfatizando a temática de desigualdade, por meio de cores contrastadas e vibrantes. A incorporação do estilo bollywoodiano dentro de um filme com teor tão sombrio serve para misturar a comédia com a tragédia. E os enquadramentos não são meramente aleatórios, eles estão a cada momento representando opressão social e corrupção de forma subjetiva, enquanto as luzes e sombras destacam a dualidade dos personagens.

“O Tigre Branco” não só convida à reflexão em várias dimensões, como também suscita questionamentos acerca da verdadeira satisfação do desfecho. O filme, ao retratar o sucesso de Balram, levanta a indagação de se ele se torna, de fato, uma influência positiva, considerando que o protagonista, com suas falhas de caráter, não conquista a vitória pela honestidade. A narrativa, assim, transcende as expectativas cinematográficas, proporcionando uma experiência rica e profundamente instigante.


Filme: O Tigre Branco
Direção: Ramin Bahrani
Ano: 2021
Gênero: Policial / Drama / Ação
Nota: 8/10

Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.