É mesmo necessário fôlego extra para encarar “Respire Fundo”, em que Amy Koppelman expurga o trauma silencioso de um sem fim de mulheres em todo o mundo, ricas, pobres, brancas, pretas, em casamentos felizes ou não. A adaptação do romance homônimo da própria diretora, publicado em 2003, toca numa chaga que tarda a se fechar, um drama doméstico cheio de nuanças em grande parte escuras, suavizado aqui e ali pela fotografia de Frank G. DeMarco, responsável por iluminar de quando em quando o cotidiano de uma pequena família presa de um martírio crescente.
Munida de toda a coragem, a diretora esmiúça o turbilhão de sentimentos a tomar conta de uma mãe depois do nascimento de seu primeiro filho, e por extensão também de seu marido, que tenta dar-lhe o apoio de que ela tanto precisa, mas parecer estar sempre à deriva, atento e vulnerável, tentando entender para onde iam todos os planos que os dois haviam feito. Koppelman, em vários momentos, estica demais a corda, com método, sempre muito certa quanto à maneira de voltar ao lugar para o qual tudo converge.
Julie Davis dá a impressão de viver o auge. Escritora de livros infantis de sucesso, Julie tem Nova York a seus pés, anda por toda a Grande Maçã como se estivesse em seu charmoso apartamento em Manhattan, ou na ampla casa do subúrbio para onde se muda faltando alguns meses para o nascimento de outra criança.
Calculadamente, a diretora-roteirista intercala frases em que a protagonista expressa ideias solares de recomeço e gratidão por suas conquistas a mergulhos cada vez mais opressivos na melancolia patológica desencadeada pela depressão pós-parto adquirida quando do fim da gravidez da menina. Se Julie tinha algum consolo ao mirar o êxito profissional, também esse seu fundamento se esboroa, e aos poucos nada mais faz sentido, nada mais tem graça e tudo se impregna de um cheiro de morte a princípio sem consequências imediatas, mas progressivamente avassalador.
Numa performance entre minimalista e tragicômica em determinados lances, Amanda Seyfried não acha nenhuma dificuldade para dar vida a essa mulher, mais e mais perdida de si mesma, resgatada aqui e ali por Ethan, o marido abnegado, doce e compreensivo de Finn Wittrock, respondendo à altura a todos os movimentos da colega. No meio do segundo ato, entra na história o doutor Sylvester de Paul Giamatti, como o psiquiatra de Julie, quase sempre fazendo as vezes de terapeuta do casal, mantendo o nível elevado do filme e colocando por terra vários mitos sobre a doença mental em condições aparentemente tão ditosas, nascida de lembranças tétricas impossíveis de superar, num desfecho horrível, mas de filosofia pura, capaz de salvar outras mulheres.
Filme: Respire Fundo
Direção: Amy Koppelman
Ano: 2021
Gêneros: Drama
Nota: 9/10