Canalhas. Espécie Homo Sapiens Cafajesties Modernus. Não possuem habitat natural específico, estão por toda a parte. Não fazem distinção de estado civil, nem de gênero, são homens e mulheres. Alimentam-se dos restos de corações abatidos e depois desaparecem sem deixar vestígios. O canalha atrai suas presas por simpatia, aparente inteligência, mas, sobretudo, por valer-se de um certo erotismo entorpecedor. Nelson Rodrigues, escritor e dramaturgo que escancara as mazelas humanas sem tanta delicadeza, diz que um canalha é sempre um sujeito cordial, um ameno, um amorável, que costuma ter uma florescente aura de simpatia. Pura ironia! É claro que esses adjetivos são uma sobreposição à insegurança que verdadeiramente escondem. Um cafajeste é, antes de mais nada, um egoísta. Aquele que pouco se importa com o que causa no outro. Aquele que não se submete, não faz par, não fideliza.
Mas será que quem se atrai por um canalha é tão inocente assim?
É nossa também a responsabilidade por relações perniciosas, pois, em algum momento, por alguma razão, consentimos a aproximação. Sentir atração e deixar-se envolver por um canalha é entrar para uma partida de poker com a ingenuidade e candura da Chapeuzinho Vermelho. Fazê-lo se apaixonar, se envolver é perda de tempo. Os que insistem investir em relacionamentos impossíveis — prenúncio de começo, meio e final infelizes — podem estar boicotando a própria realização amorosa. Pois, ao seguir obstinado em conquistar o inconquistável amor de um canalha, acaba-se por não viver amor algum.
Faz parte da conquista um certo mistério, para que a fantasia crie sobre o outro um espaço de aproximação. Se déssemos tão de cara com a verdade alheia, ou seja, se estivéssemos tão diante do que o outro é, pensa e sente, quase ninguém toparia se envolver. Certamente, nossa espécie já teria sido extinta. A fantasia tem seu lugar, pois é ela que, em alguma medida, potencializa as relações. Porém, algumas pessoas costumam se atrair por relações que jamais darão certo. Fantasiam a conquista, são instigadas pelo desafio de converter um cafajeste em um sujeito romântico. Nenhum investimento afetivo, nesses casos, resultará em amor. Embora ele não diga, todos sabem o que o lobo quer na verdade.
Mas, quem nunca deixou-se enganar? Quem nunca carregou uma cesta de boas intenções e deu de cara com o lobo mau ao invés da doce vovó? Não há mal nenhum nisso, estamos todos propensos a esses encontros infortúnios. A contrariedade está em não aprender com essa experiência, permitindo que esse tipo de relação seja a regra, não a exceção.
Sabe, depois de cruzar com o lobo, fica mais fácil reconhecer quando outros da mesma espécie surgem em nossas histórias. Então, cair na mesma armadilha torna-se uma questão de escolha. Sejamos honestos com nossas intenções: queremos verdadeiramente nos aventurar pelo caminho do amor ou tão somente nos divertir com o lobo pela estrada afora?