À primeira impressão, “Nosso Amigo Extraordinário” é um tanto ridículo. Mas não se engane. Há muito mais nesta fábula profunda, sensível e cativante. O título original é “Jules”. Apesar disso, o personagem que dá nome ao filme nunca pronuncia nenhuma palavra. Ele (que na verdade é a atriz Jade Quon) é um alienígena adorável e silencioso, cujo disco voador pifou no meio do quintal de uma propriedade nos Estados Unidos. O verdadeiro protagonista é Milton (lindamente interpretado por Ben Kingsley), um idoso que mora em uma pequena cidade no interior da Pensilvânia e encara dois dos implacáveis ciclos de sua vida: a velhice e a demência. É no fundo de sua casa que cai a nave espacial.
Durante alguns dias, o alienígena permanece no interior de seu veículo intergaláctico. Milton olha de longe, acha esquisito, finge que nada está acontecendo e leva sua vida adiante. Solitário e melancólico, ele participa de reuniões da prefeitura, onde repete suas demandas triviais, mas não completamente inúteis, buscando em algum momento ser ouvido, ou talvez compreendido.
O filho de Milton não liga e não dá notícias desde que saiu de casa e mudou de cidade. A filha Denise (Zoe Winters) está preocupada com o comportamento confuso do pai e pretende fazer uma intervenção, forçando-o a aceitar uma cuidadora ou a ir para uma casa de repouso. As intenções, embora boas, irritam e amedrontam Milton, que resiste em reconhecer que seu cérebro está falhando.
Até que um dia ele se depara com o alienígena encolhido em seu quintal. Apesar do choque inicial, ele oferece um cobertor e um copo com água. No dia seguinte, a criaturinha se aproximou da porta da casa. Então, ele a convida para entrar, oferece comida, ensina a mexer no controle da televisão e lhe apresenta seu programa favorito: CSI. Milton descobre que o único alimento que o alienígena come é maçã. Então, ele vai ao mercado e compra um carregamento da fruta. Inocentemente, conta sobre o extraterrestre em seu quintal para o caixa do estabelecimento, que o denuncia à filha: Milton está definitivamente perdendo a sanidade.
Conforme os dias passam, Milton e o alienígena formam um vínculo singelo e, ao mesmo tempo, profundo. Uma conhecida, Sandy (Harriet Sansom Harris), vai até a casa e é apresentada ao visitante. Dias depois, a vizinha enxerida, Joyce (Jane Curtin), também descobre a existência do extraterrestre, que é apelidado carinhosamente por Jules. O trio decide manter sua presença em segredo, afinal, o destino do novo amigo pode ser trágico nas mãos do governo e de cientistas exploradores.
Aos poucos, a amizade de Jules com os três idosos se torna algo sublime. Uma conexão única e telepática entre almas. A amizade é tão ingênua, pura e verdadeira, que é impossível não se sentir tocado por essa história de lealdade, proteção e companhia. Embora Jules não se expresse por meio de palavras, eles encontram por meio de desenhos, e principalmente por olhares, uma maneira de se comunicar. O olhar de Jules é extremamente expressivo, embora muitas vezes enigmático.
Com uma estética inspirada nos anos 1950, de filmes como “O Dia em Que a Terra Parou”, e quase nenhum uso de CGI, o longa-metragem dirigido por Marc Turtletaub trata, de forma muito poética e vulnerável sobre como ainda é possível estabelecer vínculos no crepúsculo da vida, ser compreendido, encontrar uma missão e um sentido para a existência. Com atuações extraordinárias, se este filme não tocar seu coração, você precisa urgentemente ir ao médico para checar se ainda tem um.
Filme: Nosso Amigo Extraordinário
Direção: Marc Turtletaub
Ano: 2023
Gênero: Drama/Comédia
Nota: 10