O imortal discurso de Martin Luther King “Eu tenho um sonho…” ocorreu em 28 de agosto de 1963 na Marcha sobre Washington por Trabalho e Liberdade, um protesto que reuniu cerca de 250 mil pessoas e é um marco na luta pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos. E embora o senhor King seja um ícone da luta e o grande nome lembrado como liderança deste movimento, o cineasta George C. Wolfe faz questão de nos evocar o mentor por trás da manifestação, Bayard Rustin. No longa-metragem intitulado “Rustin”, onde Colman Domingo interpreta o ativista que dá nome ao título, conhecemos a história do homem que foi um mentor para King e participou de diversos movimentos, não só aqueles em defesa da comunidade afro-americana, mas também antiguerra, comunista, por dignidade alimentar no campus da Universidade de Wilberforce e outras causas.
Se você nunca ouviu falar do nome Bayard Rustin, saiba que isso não foi por acaso. Homossexual, ele sofreu com homofobia dentro dos próprios movimentos em que frequentou e liderou e passou por uma tentativa quase muito bem-sucedida de apagamento de seu nome e sua história de luta. Domingo atua de maneira calorosa, vulnerável e afetiva, nos aproximando tanto das emoções de seu personagem, que é difícil não sentir imediata empatia. Nos revoltamos, nos magoamos e nos alegramos com ele a cada passo de sua jornada.
O filme acompanha a trajetória de ativismo de Bayard, as disputas entre lideranças dentro dos próprios movimentos, a desunião, os preconceitos, mas também a mobilização, os apoios surpreendentes e as conquistas que vieram com a Marcha sobre Washington. O longa-metragem também aborda seu romance com o personagem fictício Elias Taylor (Johnny Ramey), que no filme interpreta um líder religioso do Alabama, mas que no desenvolvimento do roteiro de Julian Breece e Dustin Lance Black representa os diversos relacionamentos de Rustin com homens que viviam vidas de aparência sem poder assumir perante sua família e comunidade que eram homossexuais.
Enquanto nos lembra como seres humanos comuns, cheios de defeitos, inseguranças, vulnerabilidades emocionais e limitações de poder faziam o que podiam e tinham resultados extraordinários na luta pela justiça social, o filme também soa como uma crítica aos próprios movimentos, que muitas vezes acabam sendo, em algum ponto, excludentes e hipócritas. Mas tudo isso faz parte da natureza humana, complexa, intricada e cheia de nuances. Rustin também é um personagem multidimensional e que passa por diversos conflitos pessoais, que acabam afetando, de alguma forma, suas ações como ativista.
Em entrevista, Wolfe afirmou que com seu filme ele pretende erradicar de uma vez por todas as dúvidas sobre quem foi Rustin. Ele quer que o nome do ativista seja reconhecido, lembrado e honrado como o líder que foi. É preciso ainda destacar que Rustin era conhecido também por ser extremamente culto, inteligente e refinado.
Um filme memorável, com uma edição dinâmica e cheia de recortes verdadeiros de época que se misturam às cenas gravadas, “Rustin” é uma das maiores apostas da Netflix na disputa ao Oscar. Além disso, Domingo é um dos favoritos na disputa pela estatueta de melhor ator. E merecidamente.
Filme: Rustin
Direção: George C. Wolfe
Ano: 2023
Gênero: Drama/História/Romance
Nota: 10