Seguindo fórmula de ‘Resident Evil’, filme baseado em jogo com mais de 150 milhões de cópias vendidas está na Netflix Divulgação / Constantin Films

Seguindo fórmula de ‘Resident Evil’, filme baseado em jogo com mais de 150 milhões de cópias vendidas está na Netflix

Paul W.S. Anderson parece meio obcecado com videogames, com alguma razão. Depois do sucesso estrondoso da série “Resident Evil” (2002-2016), o diretor se enfronha na história de uma guerreira e seus subordinados tentando sobreviver depois da tempestade de areia que os transporta para um universo paralelo, um tanto mágico e bastante hostil, em “Monster Hunter”, onde aplica a fórmula de que já lançara mão na franquia que o consagrou.

Anderson, uma espécie de guru dos nerds — mormente os que empenham um tempo precioso de seu cotidiano assumindo novas identidades em jogos eletrônicos —, conta com esse nicho a fim de replicar o sucesso dos filmes sobre crimes aparentemente inexplicáveis que assolam Raccoon City, e esse é seu trunfo e sua ruína. Seu filme decerto agrada os iniciados, mas quem não tem intimidade com a saga da tenente Nathalie Artemis, lutando contra inimigos tão fabulosos quanto brutais, sente-se como uma criatura marinha num deserto escaldante.

A trilha sonora de Paul Haslinger aproxima-se bastante da música usada em diversões cibernéticas enquanto uma arca se desloca por uma imensa extensão de terra árida. Dentro dela, a tenente Artemis não tem muita ideia sobre como vai acabar sua missão, nem se poderá levar seus comandados ao destino original em segurança. Milla Jovovich, a musa (e esposa) de Anderson, apresenta um desempenho satisfatório à frente do novo projeto, mas não se pode dizer que sua figura emule a simpatia que Alice, a heroína de “Resident Evil”, desperta. Acomodada, Jovovich transpõe para “Monster Hunter” quase todos os cacoetes de sua outra personagem, amenizando-os de quando em quando à medida que o diretor introduz o elenco nas particularidades do que é contado. A Ranger não perde a oportunidade de expressar a Dash, a colega vivida de Meagan Good, seu incômodo diante de tantas mudanças, separações compulsórias, o véu do desconhecido em tudo. 

Sua solidão mais indevassável é açulada e contida com igual força com a entrada em cena do caçador de monstros do título. Tony Jaa aporta no filme encarnando a sombra que paira entre a pretensa bondade de um lugar misterioso ainda por se deixar conhecer e a violência crua que grassa aqui nesta Terra desde sempre. Lamentavelmente, Anderson prefere destacar no roteiro a composição física de seu trabalho — que, não se pode negar, adquire substância dramática com o embate dos mocinhos de Jovovich e Jaa e um impressionante dragão criado pela computação gráfica da equipe liderada por Erica Van Den Raad. O problema é que o diretor leva quase dois terços do longa tentando achar o tom adequado para as metáforas que encadeia sem nenhum método, sobretudo na abertura, até que soa o gongo, tudo se desvanece e resta a sensação de que nossos monstros são imbatíveis em sua truculência. E que eles nos acham seja em que mundo nos escondamos.


Filme: Monster Hunter
Direção: Paul W.S. Anderson
Ano: 2020
Gêneros: Ação/Aventura
Nota: 7/10

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.