Na Netflix: uma das estreias mais esperadas de 2023, filme com Sylvester Stallone vale cada segundo do seu tempo Divulgação / Netflix

Na Netflix: uma das estreias mais esperadas de 2023, filme com Sylvester Stallone vale cada segundo do seu tempo

Alguns atores ficam marcados por um único papel durante toda sua vida. Acreditava-se que este curso seria o mesmo que Sylvester Stallone percorreria em sua carreira. Nascido em Nova York, filho de pais pobres e com pouca educação, ele o irmão, Frank Jr., sofriam com a rotina constante de abusos debaixo de seu próprio teto. Frank e Jackie, seus pais, acordavam gritando um com outro, negligenciavam os filhos e eram constantemente fisicamente agressivos, segundo ele e Frank Jr. relatam em “Sly”, documentário que narra a trajetória do ator.

“Sly” é um tanto revelador. O título do filme é, também, o apelido carinhoso que Sylvester Stallone recebeu dos amigos e da família. Uma figura imponente, intimidadora e máscula, ele sempre foi um modelo de força e um ícone para meninos dos anos 1980 e 1990, que cresciam vendo “Rocky” e “Rambo” na sessão da tarde. Mas o documentário de uma hora e meia, dirigido por Thom Zimny, abre as cortinas para o inesperado: Sylvester é, por baixo de sua concha grossa, um homem carente e sentimental.

Sua necessidade de ser amado e acolhido pelos fãs veio da infância com os pais narcisistas. Registros inacreditáveis mostram Frank, durante um jogo de polo com Sly, já quando o ator era famoso, derrubar o próprio filho propositalmente do cavalo com um golpe de bastão. O animal pisou em cima de Sylvester, que se feriu, enquanto o pai simplesmente deu as costas. Na infância, um episódio igualmente traumático e absurdo, também durante uma partida de polo, deixou Sly magoado com Frank. O pai, insatisfeito com a forma como o filho lidava com o cavalo, o enforcou e o atirou no chão. A agressividade de Frank neste dia fez com que Sylvester desistisse de ser um atleta profissional, embora ele adorasse polo e cavalos.

A relação turbulenta com Frank sempre foi um peso para Sly e moldou sua carreira. Durante muito tempo, na vida adulta, Sylvester perambulou de teste em teste tentando papeis interessantes no cinema. No entanto, seu talento simplesmente não era reconhecido. Não o consideravam bom o bastante ou carismático. Cansado de implorar por personagens com profundidade, Sylvester decidiu escrever e filmar seus próprios filmes, com ajuda do irmão, Frank Jr.

Quem poderia imaginar que quando Sly assumisse o controle de sua carreira, ele presentearia o mundo simplesmente com um dos melhores filmes da história do cinema, “Rocky”? Até então, seu papel menos decadente havia sido o de Stanley Rosiello, em “Os Lordes de Flatbush”, em que os roteiristas e diretores lhe deram liberdade criativa para fazer seus próprios diálogos e realizar modificações no roteiro. Sylvester não havia sido um bom aluno durante a infância. Suas redações estavam longe de serem perfeitas. Com os roteiros, no entanto, ele parecer ter um brilho, algo especial. Sylvester sabia exatamente o que os personagens deveriam dizer e fazer para cativar o público.

Em “Rocky”, a relação do boxeador com o pai também é turbulenta. No entanto, Sly nunca confrontou seu pai como seu personagem. Ele idealizou situações que gostaria que tivessem acontecido e as incluiu em seu enredo. A história emocionante de decadência e glória era a sua própria. Tudo que ele escreveu foi se inspirando em sua vida, na sua relação com as pessoas, seus conflitos pessoais e sua busca pelo sucesso. E, assim como “Rocky” imitou a vida, a vida também imitou “Rocky”. Sylvester foi aclamado, virou um verdadeiro fenômeno mundial e ganhou três Oscars com um filme literalmente caseiro.

Da noite para o dia, Sly era famoso, amado pelo público e rico. No entanto, o sucesso só amargou ainda mais a relação com o pai, que não suportava ver o filho ser melhor que ele. Frank chegou a escrever um roteiro plagiado de “Rocky”, que enviou para o produtor de cinema e diretor John Herzfeld. Frank tentou passar por cima do próprio filho para se destacar no cinema, que nunca foi sua vocação.

“Sly” acompanha boa parte da jornada cinematográfica de Sylvester enquanto analisa sua conturbada relação com o pai. Também sobre como seu sucesso afetou a carreira do irmão, Frank Jr. O filme retrata aspectos desconhecidos da vida do ator e que nos revela que a figura de machão é mera fachada e que, por trás dela, existe um homem tão humano, machucado e sensível quanto é possível existir.


Filme: Sly
Direção: Thom Zimny
Ano: 2023
Gênero: Documentário / Biografia
Nota: 9/10

Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.