O namoro acabou, mas a nossa música continua tocando

O namoro acabou, mas a nossa música continua tocando

A vida dá voltas e, no vai e vem da valsa, vamos agregando semelhantes e somando desafetos. Nos unimos quando reconhecemos no outro um pedaço nosso. Talvez porque fazemos uma ideia encantadora de nós mesmos e, por isso, nos agrada tanto encontrar algo de bom e familiar ali, bem diante do nariz. Mas, do mesmo jeito que nos atraímos por conexão e reconhecimento, nos separamos pela desarmonia e diferença. É que, às vezes, o disco arranha e os passos de dança tropeçam no salão da vida. Nos soltamos as mãos e viramos as costas, acreditando que não mais nos veremos. Até que a nossa música volta a tocar e os nossos caminhos se cruzam novamente.

Destino, lei do retorno, ação e reação. Tanto faz o nome que se dá ao desfecho das histórias mal resolvidas. A vida é uma escola que só faz passar de ano quem souber toda a matéria, dominar os problemas e assimilar as respostas. Talvez a gente não entenda os porquês ou as razões que nos fizeram repetir a mesma música e dançar novamente os mesmos passos. Mas a questão não é decifrar a música: é, sim, aprender a dançá-la.

O refrão toca incontáveis vezes, insistindo em nos lembrar o que fizemos e o que deixamos de fazer com o outro e com nós mesmos. Topamos com fragmentos da nossa vida que soam como uma nota fora do tom, incomodando o ouvido sensível e confundindo os nossos passos errantes e viciados. Como aprendizes nos esbarramos, desajeitados, tentando retomar o encaixe de antes, na tentativa de que sejamos mais desenvoltos e entusiasmados.

No momento em que os nossos olhares se encontrarem e pousarem um no outro, assim como as nossas mãos suadas e frias, vou me reencontrar em você e você se reconhecerá em mim. Como nos velhos tempos, como se o tempo não tivesse passado, como se fosse a primeira dança…

Vou procurar as mágoas do pretérito e notar que elas partiram levando embora todas as culpas e dúvidas. Com um sorriso próspero, desejo encontrar questões encerradas e lições aprendidas. Anseio ter a serenidade dos que perdoam e a convicção de que sou mesmo imperfeita.

Aliás, desisti de ser a dona da verdade. Insistir em estar sempre certa é cansativo demais. Deixo essa tarefa para os jovens, que dançam descalços ao som monocórdio até o raiar do sol. Prefiro a minha balada em outro ritmo, ter um ombro para apoiar minhas incertezas, um par de mãos na cintura que me direcione, e o afago dos corpos se sobrepondo ao fardo de ter sempre a razão.

Vou dançar com a leveza dos que superaram as dores das quedas, sem me importar com os passos equivocados, as outras músicas e os outros pares. Me vale a nossa música e o nosso encaixe restabelecido, o meu aprendizado, o teu ensinamento, e vice-versa.

Não importa se seguiremos rumos distintos. Eu sei que toda vez que tocar a nossa música dançaremos juntos, onde eu estiver, por onde você andar.

Karen Curi

é jornalista.