Krisztina Tóth é uma autora conhecida por descrever contradições e trazer à tona incômodos em uma sociedade multicultural e miscigenada que compõe o Leste Europeu. Em “Pixel”, primeiro livro da autora publicado no Brasil e editado pela DBA (171 páginas), a escritora húngara toca nesses temas em 30 textos que correspondem a diferentes partes do corpo — despedaçado, mas ainda assim um corpo.
O título revela uma das características principais da obra: cada capítulo é uma peça de um quebra-cabeça que integra a trajetória de diferentes personagens. Cabe ao leitor encontrar na própria desordem um caminho, observar de longe e atento para então entender a imagem completa, tal qual como em uma fotografia pixelada na tela de um computador.
Lançado originalmente em 2011, a crítica descreveu o livro como uma obra inclassificável com relação ao gênero. Não está evidente que se trata de um livro de contos, nem que se encaixa como um romance.
A versão de “Pixel” traduzida para o português brasileiro é de Zsuzsanna Spiry, especialista na obra de Paulo Rónai e um dos principais nomes da tradução do húngaro no Brasil. Entre seus trabalhos mais recentes estão a tradução do infanto-juvenil “Clarinha e Samuca: Um Conto de Fadas sem Fadas”, de Gyula Urbán, e “O Crematório Frio” de József Debreczeni, que será publicado em 2024. “Pixel” chega ao Brasil com apoio da Bienal Internacional do Livro de Jaraguá do Sul (SC), onde Tóth abriu a agenda de lançamentos no país ao lado da tradutora.
No livro, cenas da vida cotidiana de seus personagens revelam diferenças culturais, classe, gênero e raça. Em uma sociedade fragmentada, na qual diferentes vieses se distanciam e se aproximam, aparecem em píxeis a xenofobia, o desencanto e marginalidade. No entanto, o leitor não encontrará um livro difícil. Essas feridas surgem entre a poesia e a intimidade de casais e familiares em sua vida cotidiana. Estranhos se encontram nos textos de Tóth, em alguns momentos dispersos em pré-julgamentos, em outros próximos compondo a complexa trama social.
A todo momento a autora apresenta características de Budapeste e da Hungria, com um povo entrelaçado por línguas em uma cidade e país em que convivem culturas múltiplas. Há um abismo entre alguns personagens, principalmente pela incompreensão das diferenças. São pessoas que ocupam o mesmo espaço, porém, como estrangeiras.
No “Capítulo nove ou a história dos dedos”, Tóth escreve: “É por causa de nossa mãe que aprendemos a falar, e aí ela nunca mais nos escuta, e então aprendemos línguas estrangeiras para continuarmos nos sentindo estrangeiras. Quanto mais línguas, tanto mais estrangeiras somos no mundo”.
A linguagem aparece como um elemento central em “Pixel”. Tal qual como a história de um casal que sobrevive sem reservar tempo e diálogo para o contato mais íntimo ou uma mulher que fura as orelhas para usar brincos e agradar um pretendente indiano, “Pixel” expõe os abismos de um mundo contemporâneo, conectado, barulhento, mas disperso em recortes e, ironicamente, estruturado em silenciamentos.
Krisztina começou a carreira como poeta. Atualmente, tem livros traduzidos em vinte idiomas. Sua obra é vasta e premiada, composta por mais de trinta livros de poesia, prosa, teatro e infantis. Em 2022, um de seus títulos, “Os Olhos do Macaco”, figurou na lista dos mais vendidos entre obras de ficção na Hungria.