Na Netflix, filme com Joaquin Phoenix e Scarlett Johansson é um dos romances mais belos da história do cinema, e você não assistiu Divulgação / Warner Bros

Na Netflix, filme com Joaquin Phoenix e Scarlett Johansson é um dos romances mais belos da história do cinema, e você não assistiu

O cinema, em sua essência, vai além da simples ideia de ser um veículo de mensagens ao mundo; frequentemente, se torna um ambiente onde os filmes dialogam entre si. Esta visão inovadora torna-se clara ao analisarmos “Ela”, obra-prima de Spike Jonze, lançada em 2013, com Joaquin Phoenix como pilar central de sua narrativa. O destaque deste filme não está somente em sua aclamação pública, mas na maneira distinta como se desenvolve, não visando a aplausos retumbantes, mas um diálogo introspectivo com obras anteriores, coroando a carreira de Jonze com um Oscar pelo seu roteiro sem paralelos.

A trama desenvolve-se com delicadeza, narrando a vida de Theodore, vivido de forma magistral por Phoenix, um escritor solitário de cartas pessoais. Ele está em um limbo emocional, incapaz de se desvencilhar completamente dos laços com sua ex-companheira, interpretada por Rooney Mara. Em busca de consolo em sua solidão, Theodore recorre a uma solução tecnológica avançada: um sistema operacional que promete companhia por meio de uma inteligência artificial realista e adaptável. Surge Samantha, a entidade digital com a voz envolvente de Scarlett Johansson, que, surpreendentemente, preenche o vazio em sua vida, inaugurando uma fase de conexões íntimas e emoções intrincadas, baseadas em diálogos que desafiam o limite entre o humano e o sintético.

No âmbito visual, a cinematografia de Hoyte Van Hoytema colore a tela com tons pastéis, mesclando sutilmente a nostalgia do design dos anos setenta com vislumbres de um futuro próximo. O cenário, oscilando entre as paisagens urbanas vibrantes de Xangai e Los Angeles, serve de pano de fundo para esta jornada emocional, acentuada por escolhas audaciosas como reposicionar janelas e usar reflexos para encher as cenas de luz natural, retratando a dualidade da experiência humana na solidão coletiva de locais públicos.

Contudo, a genialidade de “Ela” não se limita às suas realizações técnicas ou à trama envolvente. Há nuances mais profundas, sobretudo na forma sutil como Jonze dialoga com “Encontros e Desencontros”, filme introspectivo de Sofia Coppola, sua ex-esposa. Pelo prisma da ficção, Coppola explorou a alienação e a busca por conexão, temas que ecoam em “Ela”, mas sob uma ótica que reflete a resposta emocional de Jonze ao relacionamento anterior. Aqui, Theodore não é apenas um personagem, mas um portal para a vulnerabilidade do cineasta, uma confissão tácita sobre seus desafios após o fim de um romance.

As memórias compartilhadas entre Theodore e sua ex-companheira Catherine são mostradas de forma sutil, quase etérea, ressaltando a melancolia mesclada à esperança cautelosa de um reencontro emocional. Esta dinâmica espelha possíveis reflexos da relação entre Jonze e Coppola, particularmente evidenciados em trocas de diálogos crús que parecem ultrapassar a barreira da ficção, insinuando uma realidade onde ambos buscavam sintonia em suas expectativas e identidades.

“Ela” é uma confissão, um diálogo entre duas obras de arte separadas pelo tempo, mas ligadas por temáticas similares. Representa uma reflexão sobre o amor, a idealização do ser amado, a árdua caminhada do desapego e um vislumbre de um futuro onde corações humanos poderiam se unir ao intelecto digital. Mais do que um filme, “Ela” convida o espectador a refletir sobre a condição humana, proporcionando não apenas entretenimento, mas uma experiência que ressoa no íntimo de quem assiste.

Em sua essência, “Ela” se consolida como um marco no cinema, não por autoafirmação, mas pela capacidade única de suscitar reflexões filosóficas e debates contínuos. É uma experiência que desafia nossa zona de conforto, confrontando-nos intensamente com o espelho de nossos sentimentos e a complexidade de nosso anseio intrínseco por conexão.


Filme: Ela
Direção: Spike Jonze
Ano: 2013
Gênero: Drama/Romance
Nota: 10/10