Você não vai querer dormir depois de assistir ao terror sueco que acaba de chegar na Netflix Robert Eldrim / Netflix

Você não vai querer dormir depois de assistir ao terror sueco que acaba de chegar na Netflix

Relações alicerçadas sobre o solo instável do compulsório só podem se manter caso todas as partes atentem para aquela velha regra básica que recomenda não ultrapassar o território do outro, lembrar de que todos podemos contar com direitos, claro, mas o direito de qualquer indivíduo, por mais fundamental que seja, termina antes que comecemos a usurpar as licenças alheias. O progresso talvez não se constitua uma boa ideia quando não é capaz de seduzir todos os membros de uma comunidade, e então fica no ar uma bruma de desconforto, de ressentimento, que não raro empesteia o que era não puro, mas saudável até então.

Em “Conferência Mortal”, colegas de idades variadas que se reúnem num hotel simples nas imediações de Estocolmo para burilar os talentos de que farão uso numa empreitada que desperta reações as mais ácidas da circunspecta população do lugar além de suportarem-se uns aos outros, são obrigados a se defender de um misterioso assassino em série, cujo humor peculiar esconde por trás da cabeça de um amistoso boneco. Emulando grandes mestres do suspense, o roteiro do diretor Patrik Eklund e Thomas Moldestad primeiro arma uma grande confusão em torno da verdadeira natureza de cada um de seus personagens para, no final, colocar tudo na sua devida proporção, dependendo para isso dos elementos subjetivos que tornam o filme surpreendentemente macabro.

Na abertura, uma maquete enodoada de sangue dá uma explicação breve quanto ao que se verá no depois ao passo que a versão funebre de uma peça de Richard Wagner (1813-1883) imunda o ambiente. Embora flashbacks tenham sido usados até com certa displicência em produções do gênero, Eklund acha um meio de soprar para o espectador uma lufada de ar fresco. Os dias de sossego em Kolarängen, subúrbio da capital sueca, aproximam-se do fim, mas antes, o grupo chefiado por Ingela desloca-se por uma estrada de pouco movimento até o lote onde será construído um shopping, o que, ela nunca se cansa de lembrar, sustentará uma nova era. Maria Sid dá vida a muito do espírito de sátira de costumes que se abatem sobre todos os rincões da Terra, e a Suécia, por mais que se duvide, experimenta a mesma tragédia.

O longa vai se distanciando do romance homônimo de Mats Strandberg, publicado em 2021, à medida que o diretor consegue puxar seu trabalho para o slasher mais rudimentar, sem tantas firulas. Eklund o faz guardando mantendo todo o segredo que pode quanto à identidade do assassino em série que elimina suas vítimas, invasores do que tem por seu reino, e literalmente perde a cabeça ao termo de uma carnificina que não deixa nada a dever a “A Hora do Pesadelo” (1984), de Wes Craven (1939-2015).


Filme: Conferência Mortal
Direção: Patrik Eklund
Ano: 2023
Gêneros: Terror/Comédia
Nota: 8/10

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.