O tempo não para. A vida não pausa. Dizem que o que é nosso está guardado, mas os donos da mesma retórica dizem, também, que milagres não caem do céu. Então, por via das dúvidas, entre ir ou ficar, eu decido partir. Prefiro pecar por excesso a errar por falta, e fazer a parte que me compete com a pressa dos que correm atrás da própria felicidade. Fujo da vida ao mesmo tempo em que me apresso para viver.
Corro de gente mesquinha, dos avarentos de sentimento e condolência. Corro dos mal-educados, que se esquivam para não cumprimentar, que olham e fingem não ver, que sujam as ruas, que xingam no trânsito. Corro dos arrogantes mirando por cima e nos fazendo sentir por baixo, no alto de suas autossuficiências e superioridades, passando feito um trator pelas cabeças dos outros. Corro dos egoístas, que não se importam com nada além do próprio umbigo. Corro dos caprichosos, que exigem que os seus desejos sejam prontamente atendidos. Corro dos mentirosos e suas falácias e histórias fabulosas.
Corro, também, dos estressados sem motivo, dos pessimistas e suas lamúrias, dos insensíveis, ardilosos, invejosos, debochados, interesseiros. Corro dos coitados, dos sanguessugas, dos incrédulos, dos possessivos, dos malucos! Corro para bem longe! É o melhor que tenho a fazer, pois — se eu ficar — a tendência é que me atole nessa lama humana e me impregne na miséria do ser, me misturando aos indivíduos fajutos e, consequentemente, me tornando um deles.
É que eu não quero ser pouco boa e muito má, tampouco me igualar por baixo, ao nível raso dos indiferentes aos problemas do mundo, dos desatentos às condições dos próximos. Não estou disposta a me desprender dos meus valores e chafurdar no mar do menosprezo. Não admito me esquecer de quem sou, de onde vim e por onde andei.
Então, na mesma velocidade em que deixo para trás essa gente que nada me acrescenta e que só me consome, disparo em direção aos cidadãos de bom humor e de bem com a vida. Me jogo ao encontro dos gentis e educados, aos corações humildes e caridosos. Me atiro aos amáveis, sensíveis, honestos, de sentimentos puros e felicidade singela. Esses, sim, eu permito que sejam os meus semelhantes nessa jornada chamada vida.
Aqui vai meu conselho para todos os males e todas as bênçãos: corra. Quando você tiver medo e começar a entrevar, corra. Quando você estiver feliz, corra para que a alegria permaneça por dentro. Quando se sentir sozinho, corra em busca de um abraço. Quando se sentir amado, corra para espalhar o amor. Quando tiver dor, corra até passar. Quando se perder, corra até se achar. Correr nos liberta das prisões da alma.
Sejamos livres de todos os pecados, correndo dos males da humanidade e dos nossos próprios fantasmas, até encontrarmos a própria sorte. Porque a verdadeira felicidade é tornar-se íntimo de si mesmo, sem se assustar.