Último dia para assistir na Netflix ao filme indicado a 4 Oscars, que Steve Carell considera sua melhor atuação Divulgação / A-Film Distribution

Último dia para assistir na Netflix ao filme indicado a 4 Oscars, que Steve Carell considera sua melhor atuação

Homens são feitos de obsessões, mas há quem se deixe vencer pelos gostos e apetites que considera maiores que sua própria vida, jogando-se no precipício para onde arrasta muita gente, numa manobra tão perversa como definitiva. John Eleuthère du Pont (1938-2010) não poupou esforços quanto a tornar real o sonho de se fazer notar, e à medida que ia conquistando espaço e admiradores — para não mencionar a fortuna de 14,3 bilhões de dólares, dos quais tinha direito a um bom naco —, tinha a certeza de que o mundo lhe devia muito mais.

Com “Foxcatcher — Uma História que Chocou o Mundo” Bennett Miller embrenha-se corajosamente no pântano da vida de Du Pont, iluminando muito da personalidade para além de um exotismo mórbido de um daqueles sujeitos visivelmente sem norte, tomado pela bruma de sensações conflituosas que dinheiro nenhum é capaz de amaciar.

O texto cuidadoso de Dan Futterman e Eric Max Frye privilegia a figura do bilionário, cuja profundidade dramática é de fato assombrosa, abrindo oportunas brechas para que dois personagens também digam a que vieram, fechando o arco e revelando a verdadeira identidade de um facínora.

Dois marmanjos praticam luta de contato num tatame meio velho. Pouco depois, um deles comparece à Escola Primária McKinley, para falar a um auditório de crianças entediadas de uma cidadezinha do Utah, oeste dos Estados Unidos. Três anos antes, nos Jogos Olímpicos de Los Angeles de 1984, Mark Schultz ganhava o ouro no esporte do qual passou a ser um embaixador, mas se dependesse dessa atividade para viver, ganhando vinte dólares por palestra, não comeria nem o lámen aguado que prepara num misto de fúria e resignação.

Miller faz bom proveito das imagens sugeridas por Futterman e Frye, dispondo a peça que inaugura o portentoso mosaico que se levanta em torno de Mark, o caçula dos Schultz, que recebe os cartolas da Confederação Nacional de Luta Olímpica com entusiasmo ainda menor que o visto no encontro com os alunos da McKinley. Fica cada vez mais evidente o surdo desespero desse homem encurralado pela vida, com Channing Tatum admiravelmente confortável no papel, até nos lances em que o irmão, Dave, rouba a cena encarnando a face mais brilhante da moeda.

Também contando com uma medalha de ouro olímpica no currículo, o primogênito tem a vantagem de ser efusivo, solar, daí ser tão chocante o que lhe acontece, já na última sequência — este é um filme lento, na melhor acepção da palavra. O Du Pont vilanesco, por seu turno, aparece desde sempre, com Steve Carell no controle absoluto do antagonista, manifestando com intensidade variada a loucura do bilionário, que se torna o mecenas de Mark numa retomada de sua carreira, improvável, exitosa e marcada por uma covardia trágica.


Filme: Foxcatcher — Uma História que Chocou o Mundo
Direção: Bennett Miller
Ano: 2014
Gêneros: Drama
Nota: 9/10